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terça-feira, 30 de julho de 2013

Fala por mim violão

Via Urico Gadelha

para a dupla Jair e Jamildes



COMPOSIÇÃO DE LUIZ DE FRANÇA E NELSON GONÇALVES. ESSA MUSICA FOI GRAVADA EM 1968

Visagem

Via Antonio Carlos Cruz , o antigo "Guarú" das terras do Conselheiro, tal qual MCaetano, Fausto Nilo e o alto da maravilha.



Visagem (Fagner/ Fausto Nilo) é a faixa de abertura do disco Sinal dos Tempos, lançado por Ronnie Von em 1981. Fagner gravou a música posteriormente em seu disco Palavra de Amor, lançado em 1983.

Entre a casa e a rua

Via Bruno Perdigão

Por Fernando Luiz Lara


"A mesma madame que se apavora com a ideia da empregada sentada no sofá ou ganhando hora extra tem saudades do aeroporto vazio e glamoroso. Espaços destinados exclusivamente aos ricos onde a classe trabalhadora só entra de uniforme, ou seja, a trabalho."

Em seu clássico sobre A casa e a rua o antropólogo Roberto DaMatta esmiúça o caráter dual e paradoxal da sociedade brasileira, com uma lógica servindo para as relações privadas (a casa) e outra lógica bem distinta orientando as relações públicas (a rua). Infelizmente, quando se trata de exclusão espacial, as mesmas regras valem da porta para dentro e da porta para fora.

Para entender as regras de exclusão que regem os espaços públicos e privados brasileiros, voltemos ao urbanismo português e sua lógica espacial. Na cidade espanhola, a exclusão foi codificada em 1572 pela Lei das Índias, que determinava especificamente que só espanhóis e seus descendentes poderiam viver dentro da cidade; os nativos, relegados ao espaço de fora. A mesma Lei das Índias que sedimentou o urbanismo ortogonal hispano-americano, já usado desde Santa Fé, o acampamento militar castelhano responsável pela conquista de Granada naquele mesmo fatídico ano de 1492. A lógica militar dos portugueses construtores de fortes e portos era um pouco diversa. Na cidade portuguesa, imperava a ambivalência que deixava a cidade crescer pelos caminhos naturais, seguindo a melhor topografia a partir do Paço Municipal. A mesma ambivalência também permitia que senhores e escravos coexistissem com alguma proximidade física, o que implicava exagerar na distância social.

Recordemos que, a partir dos caminhos rurais que iam se transformando em ruas, o urbanismo colonial português vendia os lotes por “testada”, ou seja, o valor do lote era medido pela medida de sua frente, de sua interseção com o espaço público. Casinhas de janela e porta eram as mais simples, com lotes que chegavam a apenas 5 metros de largura. Grandes sobrados urbanos chegavam a medir 20 metros ou mais, uma ostentação digna da riqueza das minas, do açúcar ou do café. Interessante é notar que a profundidade do lote valia muito pouco ou quase nada, na maioria das vezes a propriedade ia até o curso d’água no fundo do vale ou ao pé do morro. Escondidos nos fundos desses lotes, moravam os escravos (até 1888) ou os agregados (depois da abolição). Responsáveis por fazer funcionar essas cidades sem esgoto, sem água e sem transporte público, os agregados deveriam saber muito bem “o seu lugar”, ou seja: o espaço invisível do fundo dos lotes, literalmente os “terreiros”, longe do espaço cívico das ruas. A obsessão da polícia brasileira com a vagabundagem deriva dessas leis não escritas que regem a exclusão: pobres na rua só são admitidos carregando latas de água ou puxando carrinhos de entrega, nunca com as mãos no bolso.

Ilustração: Thiago Balbi
Acontece que, ao longo do século XX, as ruas foram se transformando em espaços mais democráticos, impulsionados pela rápida urbanização. À medida que as ruas iam se tornando mais populares, os moradores de classe alta foram se afastando da rua, primeiro descolando suas casas da calçada, com a ajuda dos códigos de obra sanitaristas da virada do século, que introduziram os afastamentos obrigatórios. Depois vieram os muros, e quando os muros se tornaram ineficientes, foi adicionado todo tipo de equipamento de segurança e, por fim, proliferaram os condomínios fechados.
Uma leitura mais conservadora deste fenômeno de afastamento progressivo da rua diria que foi a violência urbana o grande motor desse processo. Não há dúvida de que a violência é variável importante, mas temos aqui um interessante dilema de sequência temporal. Quem nasceu primeiro: a violência ou o abandono das ruas? Jane Jacobs, referência fundamental do urbanismo dos anos 1960 e 1970, já dizia que, ao se afastar da rua, a sociedade entrega esse espaço de bandeja para a marginalidade. Com janelas e quartos de dormir colados à calçada, qualquer barulho é percebido e os olhos se voltam para a rua em questão de segundos. Isolada por muros, afastamentos e andares de garagem, a rua se torna na verdade muito mais perigosa. No caso das grandes cidades brasileiras, os muros subiram nos anos 1960, bem antes de a violência chegar a níveis alarmantes nos anos 1990. E assim chegamos a “City of Walls” de Teresa Caldeira, uma urbe defensiva e armada com grades, cacos de vidro, arame farpado e cerca elétrica.

No caso brasileiro, o interessante é notar que essa urbe encastelada não vive sem seus servos. Os porteiros, babás, zeladores, diaristas, lavadoras e passadeiras são os operários dessa máquina de exclusão. A marca da ambivalência brasileira está no fato de que todos convivem “cordialmente” debaixo do mesmo teto. Mas essa cordialidade acaba no exato momento em que alguém da turma dos servos se desloca do seu lugar.

No chamado Primeiro Mundo que tanto almejamos, cada um lava seu copo e abre sua porta. Existem, sim, empregados domésticos e porteiros para aqueles com renda de alguns milhões de dólares ou euros por ano. No Brasil, a desigualdade criou uma massa de servidores domésticos que, aos poucos, vai diminuindo junto com essa mesma desigualdade. Mas como argumento fundamental desta série de textos, eu chamo a atenção para o fato de que, mesmo diminuindo a desigualdade, e com ela a oferta de subempregados de todo tipo, a forma como usamos o espaço carrega uma inércia enorme e insiste em mudar ainda mais devagar. Cada condomínio, vertical ou horizontal, tem suas regras, em geral afixadas ao lado da porta do elevador, regendo quem pode ocupar determinado espaço em determinado tempo.

A presente discussão sobre os direitos trabalhistas das domésticas é material para décadas de pesquisa antropológica sobre tais regras de exclusão. Interessante notar que porteiros, predominantemente do sexo masculino, ganharam há décadas seus direitos de jornada de oito horas, folga, adicional noturno, FGTS etc… As domésticas, predominantemente do sexo feminino, tiveram de esperar uma mulher ser eleita presidenta para terem os mesmos direitos de todos os outros trabalhadores. Mas revelador mesmo são as falas daqueles que se opõem a tais direitos. A conversa vai desde a “preservação” da oportunidade de trabalho doméstico até coisas mais prosaicas do tipo: “Onde ela vai ficar durante a hora de almoço, no meu sofá?”. Ou seja, o espaço determina a exclusão de maneira não explícita, mas não menos contundente. O sofá de hoje é o banco do ônibus do Alabama de 1950.

É chocante notar quantos “sofás” temos pela cidade afora. A mesma madame que se apavora com a ideia da empregada sentada no sofá ou ganhando hora extra (afinal de contas, ela come de graça, dizem!) tem saudades do aeroporto vazio e glamoroso do século XX. Espaços destinados exclusivamente aos ricos, onde a classe trabalhadora só entra de uniforme, ou seja, a trabalho.

Vejamos o exemplo dos flanelinhas. No momento em que as ruas se tornaram “perigosas”, surgiu esse rapaz que, por uns trocados, nos vende a ilusão de que estará ali trabalhando para que nossos carros não sejam roubados. Enquanto ele ganha moedas, tudo bem, o problema começa quando o livre mercado realmente funciona e o flanelinha diz que por menos de 10 reais não garante nada. Se portando como o dono da rua, o flanelinha é uma ameaça. Uniformizado com o colete da prefeitura, ele é menos ameaçador, mesmo que sua conduta seja exatamente a mesma. O que a classe alta precisa é da ilusão de que esse exército de servidores está sob controle (no seu lugar) e que a proximidade física esteja, então, garantida pela distância social.

Em resumo, terceirizamos aos flanelinhas o controle da rua; terceirizamos aos porteiros a vigilância sobre a rua; terceirizamos às babás o cuidado das crianças na primeira infância; e terceirizamos às empregadas domésticas as tarefas de casa. No entanto, essa terceirização vem com regras muito claras sobre o uso do espaço. Essa é a ambivalência da sociedade brasileira, que “aceita” conviver com a diferença desde que ela, a diferença, faça todo o serviço, não reclame seus direitos e, principalmente, não venha a se sentar no sofá.

Fernando Luiz Lara é arquiteto e professor associado da University of Texas at Austin, onde dirige atualmente o Brazil Center no Lozano Long Institute of Latin American Studies

Pela livre circulação de pessoas

Por Vladimir Safatle

Há algum tempo, o governo tem discutido a possibilidade de incentivar médicos estrangeiros a atuar no Brasil. Com as manifestações de junho, tal ideia entrou na pauta das prioridades. Ela foi a única resposta do Executivo à indignação popular contra um sistema público de saúde que sofre brutalmente de subfinanciamento. Todos conhecem a sina de problemas de infraestrutura, pessoal e baixos salários que atinge a saúde pública brasileira, ainda mais depois do fim da CPMF. Sem fonte suficiente de financiamento, a saúde pública parece fadada a ser um dos setores em que a falência do nosso modelo econômico fica mais evidente.

É de causar estranheza, porém, a reação violenta dos médicos contra a vinda de profissionais de outros países. São compreensíveis as manifestações que procuram insistir na maior amplitude dos problemas da área e que fazem questão de lembrar que ainda há muito para ser feito. Mas não é compreensível que isso sirva de justificativa para manifestações contra a possibilidade de estrangeiros serem chamados para trabalhar no Brasil.

No fundo, talvez sem perceber, os médicos acabam por protagonizar passeatas a favor dos “brasileiros, primeiro” que mais parecem saídos do álbum de família da extrema-direita xenófoba comum no mundo desenvolvido. Não é possível admitir nenhuma forma de reserva de mercado de trabalho, pois ela quebra um princípio caro à vida democrática: a livre circulação de pessoas. Pois durante muito tempo vimos com os olhos da indignação como países europeus e norte-americanos impediam indivíduos à procura de trabalho de circular livremente, tratando-os como criminosos em potencial. Muitos brasileiros e latino-americanos foram vítimas dessas práticas deploráveis. Por isso, não há razão alguma para repetirmos tais ações em nosso País.

Na verdade, achamos natural uma situação em que o capital tem direito à livre circulação e as pessoas têm circulação restrita. O capital pode transitar de um país a outro em qualquer momento, assim como os produtos, isso ao menos segundo os preceitos liberais da economia. Já os seres humanos devem obedecer aos limites da fronteira e ficar onde estão, a não ser se queiram fazer turismo ou trabalhem em áreas estratégicas para outras nações. Melhor seria se o inverso fosse realidade, ou seja, que o capital tivesse circulação restrita e os cidadãos tivessem liberdade de viver suas vidas onde quisessem.

Nesse sentido, o problema da validação do diploma poderia ser resolvido de maneira simples. Há uma confusão do Ministério da Educação em relação ao assunto. Ele diz respeito tanto a diplomas de graduação quanto àqueles de mestrado e doutorado. Veja o caso dos títulos de mestrado e doutorado. Se alguém faz uma tese em outro país, por exemplo, o ministério exige um pedido de validação de diploma em alguma universidade brasileira. Tal universidade comporá então uma segunda banca para avaliar a tese que já foi objeto de uma banca de avaliação em outro país. Nada mais irracional e corporativista. Muito melhor seria se o ministério estabelecesse, de uma vez por todas, uma lista das universidades consideradas compatíveis com o nível de exigência das universidades brasileiras, o que simplificaria em muito o processo de validação.

Com essas pequenas ações e reações acabamos por decidir o rosto do país que queremos. Não haveria nada pior do que utilizarmos a justa indignação contra condições aviltantes de trabalho e de infraestrutura para escondermos um estranho sentimento segregacionista que, em alguns casos, foi alimentado por reações dignas do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), pelo fato de boa parte dos médicos a ser chamados ter nacionalidade cubana. Uma sociedade rica é uma sociedade que acolhe aqueles que procuram refazer suas vidas em outro lugar e auxiliar na construção do dsenvolvimento social.

http://www.cartacapital.com.br/revista/758/pela-livre-circulacao-de-pessoas-6988.html

Anoiteceu (Francis Hime-Vinícius de Moraes)

Por Alfredo Pessoa

Essa música foi gravada recentemente por Guinga e Francis. Guinga encontrou Francis num ônibus de aeroporto e disse..."meu ídolo vamos gravar um disco violão e piano com nossas músicas". Francis não teve como recusar, acionou o selo Biscoito Fino e deu o tom musical a nova parceria produzida por Paulo Aragão. Com duas almas grandes dessas, sempre vale a pena.


Anoiteceu (Francis Hime-Vinícius de Moraes)


(Am7(9) D7/A F6/A Dm6/A)     
          
Am7(9)  A7(9/4)  Am7(9)   A7(9/4)  Am7(9) 
A luz morreu         o céu perdeu   a cor
 Am7(9)  D7/A       F6/A     Dm6/A    Am7(9) 
Anoite...ceu      no nosso grande       amor 
          Dm6/A    Am7(9) Dm6/A  Am7(9)  
A luz morreu     o céu perdeu a cor 
Am7(9)  D7/A    F6/A    Dm6/A     Am7(9)
Anoite...ceu     no nosso grande    amor 
      D7/A    F6/A Dm6/A      Am7(9)
No nosso     grande             amor 
          Dm6/A  Am7(9)   Dm6/A  Am7(9) G7(13) G7  C7M 
Ah leva a solidão de mim tira esse amor dos olhos meus
C7(9) F7M              Bm7(b5) E7(b9)     Am7
           Tira a tristeza ruim         do        adeus 
        C7/9      F6               F7M   Bm7(b5) E7(b9)       Am7 
Que ficou em mim que não sai de mim pelo amor de Deus 
         Dm6/A Am7(9)  Dm6/A  Am7(9)  G7(13) G7   C7M
Vem suavizar a dor          dessa paixão que anoite...ceu 
C7(9) F7M           Bm7(b5) E7(b9)     Am7 
          Vem e apaga do corpo             meu 
          C7(9)  F6                 F7M Bm7(b5) E7(b9)     A7(9)  
Cada beijo seu porque foi assim que ela me enlouqueceu
            Dm6/A    A7(9)  Dm6/A   A7(9)
            Fatal        cruel, cruel      demais 
 Am7(9)       D7/A    F6/A    Dm6/A     Am7(9)
Mas não faz mal quem ama não tem    paz 
                   D7/A     F6/A Dm6/A         Am7(9)
Mas não faz mal quem ama não tem    paz

Funcionária pública é condenada por sumir com processo da TV Globo

Por Notícias R7



http://noticias.r7.com/videos/funcionaria-publica-e-condenada-por-sumir-com-processo-da-tv-globo/idmedia/51f702d20cf26c5058b3262d.html

segunda-feira, 29 de julho de 2013

A ÁGUA NOSSA DE CADA DIA

por Malvinier Macedo

Adicionar legenda
“Sempre desejei ser bibliotecária. Uma certeza que morava em mim e que me levou como tal, ao ESPLAR, uma instituição que assessora grupos de agricultores e agricultoras familiares.

O sertão nordestino tem uma rica diversidade de costumes, de riquezas, de personagens, de vida. E nesse universo, uma das demandas maiores é por água para o consumo humano.

No meu trabalho sempre dividindo o tempo entre os projetos, as atividades de representação institucional e a biblioteca, no ano de 2001, aconteceu o meu encontro com o Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido: um milhão de cisternas rurais, por iniciativa da Articulação no Semiárido, cujo objetivo principal é construir uma cisterna de placas em cada casa de família com baixa renda, na zona rural semiárida.

Participei do seu nascimento e por 12 anos vivi sua implantação no sertão cearense. Esse encontro me rendeu intensas vivências que não dá para colocar em poucas palavras. E por ser um trabalho em equipe, isso me fez aprender muito, inclusive sobre mim, sobre meu papel nesse processo de transformação das condições de vida das famílias rurais.

Para levar a cisterna até às famílias, há um percurso em que é preciso localizá-las, cadastrá-las, organizar toda a documentação pedida pelo programa, consultar Cadastro da Pessoa Física, anotar o Número de Identificação Social e caso a pessoa não o tenha, encaminhá-la ao órgão da Prefeitura Municipal para que seja inserida no Cadastro Único do Governo federal.

Preencher a Ficha de Seleção e Cadastramento das Famílias é uma atividade que nos mostra a realidade dessa população através dos seus dados pessoais, nível de escolaridade, composição da família, moradia, fontes de abastecimento de água, situação socioeconômica, participação em grupos sociais, tipos de doença.

Chegamos a visitar mais de duas mil famílias em um ano e a coleta de tantos dados nos torna conhecedores in loco de uma realidade que apresenta também uma face dolorosa: alto grau de analfabetismo, doenças crônicas, pobreza, solidão, violência doméstica, dificuldades de acesso à terra, à água, a serviços básicos.

E como uma bibliotecária se inseriu nesse universo?

No atender ao público de forma satisfatória para o programa e para as famílias, levar orientação, ser atenta no preenchimento dos dados, pois um erro é fonte de problemas para o desenrolar da ação, organizar listas para os cursos das famílias e para a colocação de placas de identificação das cisternas, arquivamento das fichas das famílias por ordem numérica, ter em mãos o Termo de Recebimento da Cisterna para que a pessoa responsável pela cisterna o assine, conferir se o número da cisterna é igual ao do Termo, checar se as fotos de cada família ao lado de sua cisterna estão com qualidade para compor o Termo.

Enfim, um mundo de informações a serem coletadas, trabalhadas, cadastradas e arquivadas. Um universo no qual as bibliotecárias e os bibliotecários se sentem à vontade”.


Acerto de Contas (Djavan)

Alfredo Pessoa volta a colaborar no Diumtudo - Marvioli

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Por Alfredo Pessoa
Alfredo Pessoa

Um samba de cada vez: Djavan vez por outra solta um samba de sua mente, grava e garante que não desaprende nunca. O novo CD “Rua dos Amores” não é das melhores safras, mas também não é de se jogar fora: tem letras tristes, alegres, amorosas, etc. Como sempre um violão de ritmo imbatível. A tônica segue os últimos 3 trabalhos autorais de Djavan. Além de “Acerto de Contas” vale a pena conferir “Anjo De Vitrô”, “Bangalô”, “Pecado”, “Pode Esquecer” e “Reverberou”...Ihhh já se foi metade do disco.


 Acerto de Contas (Djavan)


G6/9 Ab6/9 G6/9 Ab6/9
 
Gm7         G°                Ebm6
Com você vivi, de verdade, eu digo tarde,
     Gm7               C7(9/#11)
Mas sei que foi sempre muito bom 
Gm7            F#7                   B7M(9)
Só fiz coisas tontas nesse acerto de contas
             Am7      D7(9)  
Quem paga é o meu coração 
Gm7     G°                    Ebm6                     
Você é tudo, o que eu sonhei, agora eu sei,
    Dm7       G74(9) G7(9)
Me faz de novo respirar...
C7M(9)     Dm7(9)     Em7(9)  A7(#5)   Am6
Outra madrugada já passou   e você nem lô,
     Fm6       C7M(9)/G  Ab6/9
Devastando a cidade.
C7M(9)     Dm7(9)       Em7(9)
O verde da mata é outra cor
      A7(#5)     Am6      Fm6
Ao sentir que estou lhe perdendo...
G6/9                        Ab6/9
Nada é mais, não sei mais, o que vou dizer,
         G6/9
Só quero poder lhe provar,
        Ab6/9
Mostrar pra você. Que eu mudei!
             Gm7
Me deixa voltar.

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Obrigado ao Marvioli por me deixar voltar.- Alfredo

Passo a passo

Por Romeu Duarte

A José Sales e Bruno Perdigão

Será possível conhecer uma cidade pelas suas calçadas? O grande Vilanova Artigas dizia ser factível medir a felicidade dos moradores de uma cidade pela beleza desta. O espaço público, sua qualidade e suas características é o que fica em nós de qualquer urbe que visitemos, a não ser que sejamos como Garrincha, que se lembrava de Paris apenas por ter sido a cidade onde o técnico Vicente Feola, quando da passagem da seleção brasileira por lá, havia levado uma desastrada queda... Eu, pedestre assumido muito antes de virar arquiteto folgado, só tenho a dizer que tentar desfrutar nossa capital a pé é tarefa que exige, dentre muitas outras virtudes, agilidade de tigre, resistência de Wolverine e paciência de Jó.
Romeu Duarte


Ah, como é difícil gostar de Fortaleza pela via do seu espaço público. Passeios estreitos, desnivelados, escorregadios, sem padrão de pavimentação, o inferno de idosos e inválidos. Out-doors, top-lights, back-lights, fachadeiros, letreiros, luminosos, quem terá a coragem, como dizia Augusto Pontes, de descascar esta Las Vegas tupiniquim e mostrar-lhe a verdadeira face? Praças abandonadas, o parquinho imundo e seus brinquedos quebrados, o vaqueiro destemido tangendo o gado garatujado com spray preto. Ah, Bárbara, Clóvis, Rachel, Patativa, o que vocês diriam se vissem como suas estátuas são por nós tratadas? Ganha um canário roubado da Feira dos Pássaros quem souber.

Palácios tombados pichados e vandalizados, “são as casas dos que nos oprimem, acho é pouco”, diz o ex-manso e gentil ativista ecológico, agora rebelde carbonário do Facebook. O ubíquo engarrafamento de cada dia nos dai hoje, Senhor, mas sem assalto, pedido de amigo, que o liso está no cheque especial e o Nokia dele é xing-ling. O jardim cheio de lixo, as flores disputando os olhares com latas de refrigerante, pontas de cigarro e preservativos usados. No vento, a voz do poeta me sussurra: “nós somos os homens ocos, nós somos os homens empalhados, apoiados uns aos outros, a cabeça cheia de palha, ai de nós!”. Diz aí do alto, Cazuza, por que a gente é assim?

Como se não fora bastante o desmazelo causado por nós próprios, os poderes públicos insistem em nos oferecer, sem nos consultar, as infelizes soluções de um urbanismo rodoviarista tardio, mera panacéia para nossos males citadinos, no qual reina absoluta Sua Majestade O Veículo Individual. E tome túnel inseguro, viaduto mala sem alça e com semáforo embaixo, rotatórias ajardinadas sem condição de acesso e uso, vias que viram rodovias sem passarelas de pedestres, afinal de contas, quem é o doido que vai ao Centro de Eventos a pé? Conseguirá a vigília de alguns poucos abnegados sob a sombra das castanholas cortadas no Cocó deter o coito ensandecido dos viadutos-serpentes?

Um alerta ressoa em todos os i-pods, i-pads, walkmans e celulares dos passageiros-sardinhas do Circular 2: “Desistam, infiéis, vocês pagarão muito caro pelos efeitos desta burrice elevada à potência da omissão e do autoritarismo. Nem a sua divindade máxima, a Ponte Estaiada, os salvará da hecatombe final”. No trajeto, uma área de risco é ocupada, a tapioca com café toma a pracinha sem cerimônia e os camelôs do Buraco da Jia penduram a mercadoria no gradil da Catedral: “Calcinha da moça da novela, uma é dois real, três é cinco real. Quer não, dona? Vai dar um up no material aí...”. Pesadelo lisérgico, exagero do cronista pessimista ou apenas a realidade nua e crua, tal como o bife desta quentinha que eu comprei ali debaixo do Tatazão?
Estejam certos: é a presença, o passo a passo firme dos que não fogem do seu lugar (que deveria ser o de todos), mesmo contrafeitos com tudo isso aí (aqui), o que vai redimir esta cidade, que fazemos, todos os dias, tão bela e tão feia.

sábado, 27 de julho de 2013

Baco e Euterpe - ano 1

Por Roberto Félix

O Sarau Euterpe e Baco completou um ano de muito sucesso ontem! Depois das tantas apresentações que aconteceram, das mais variadas e profundas, agregaram muito conteúdo e cultura para o ignorante que agora escreve.

Só tenho a agradecer a todos os amigos que fazem parte dessa turma e em especial ao Marcus Vinicius Oliveira que é o pai de todos nós bicudos e mentor do evento. Essa homenagem em forma de vinheta feita pelo Rogério Lama é apenas um pequeno símbolo da estima que temos para com o Marvioli, o Rei do Poutporri, também alcunhado de dedo nervoso no botão next.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Ó, linda Fortaleza

Por Marcus Vinicius

Esta música é uma parceria de Mateus Perdigão e Marcus Dias para o bloco Luxo da Aldeia. Na rua no pré e carnaval de rua de Fortaleza de 2014.



Ó, linda Fortaleza (Mateus Perdigão e Marcus Dias)
    
Ó linda Fortaleza               
Vem pra rua conhecer      
Os blocos e as bandinhas              
Que acabaram de nascer

Nasceram sob as bênçãos      
De Terrais e Longarinas     
Juntaram multidões            
De Pierrots e Colombinas

Fizeram e refizeram                    
Até que um dia aconteceu:
O carnaval de rua renasceu.

Seguindo a trajetória
Dos antigos foliões              
Que honraram nossas ruas              
Com seus blocos e cordões

As Bruxas e as Baianas
Que hoje não existem mais,
Resistem na memória
Dos eternos carnavais

Ó linda Fortaleza
Vem pra rua admirar
Teus filhos que acabaram de chegar:

Unidos da Cachorra
Num Ispaia, Doido é Tu
Camaleões da Vila
Taberneiros e Urubu

Baqueta, Som da Lira
Bons Amigos, Jeguerê
Pery, Matou a Pauta,
Muriçocas e Dendê

A trupe, Arrasta Tudo,
O Bode, A turma do mamão
Marmotas, Girassol
Cachorra Magra e Almeidão

O Luxo, o Sanatório,
As Gata Pira, Agora Vai
Amantes de Iracema
E o Concentra mas não Sai

Ó linda Fortaleza
Vem pra rua conhecer
Teus filhos que não param crescer... 

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Ovelha desgarrada

Vergonha

Via Fulano e Sicrano



Direção: Patricia Pillar
Produção Executiva: Renato Martins
Direção de fotografia: Mauro Pinheiro Jr.

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Vergonha
(Luciano Salvador Bahia)

Você bebeu de novo
Você bebeu na frente daquele povo
Bem nascido, bem vestido, endinheirado
Você bebeu sem cuidado

Você falou mais alto
Você desceu do salto
Cantou refrões sem qualidade
E revelou para todos a minha idade

Hoje eu acordei mais cedo
E liguei pra sua irmã
E desabafei com ela
Do jeito que você está
Eu vou cuidar da minha vida
Se a ressaca deixar
Prepare você a sua comida

Apesar do que você me faz
Eu sou mulher que ainda sonha
Hoje eu fui a praia
Com a sua irmã e a minha vergonha

Você bebeu de novo
Você bebeu na frente daquele povo
Metido a besta, enfatiotado, endinheirado
Você ficou, ficou chapado

Você falou mais alto
Me despencou do salto
Cantou pagodes da pior qualidade
E saiu berrando que eu estou chegando
A terceira idade

Hoje eu acordei mais cedo
E liguei pra sua irmã
E desabafei com ela
Do jeito que você está
Eu vou cuidar da minha vida
Se a cachaça deixar
Que prepare você a sua comida

Apesar do que você me faz
Eu sou mulher que ainda sonha
Fomos a praia: eu, sua irmã
Uma outra colega dela e a minha vergonha

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Homicídios entre jovens crescem 326% e negros são maiores vítimas

Daniele Silveira

Estudo aponta o homicídio como a principal causa de mortes não naturais e violentas entre os jovens. Em 2011, a cada 100 mil jovens, 53,4 foram assassinados



 As mortes não naturais e violentas, como acidentes, homicídio ou suicídio, cresceram 207,9% entre os jovens entre o período de 1980 e 2011. O número é ainda maior quando analisado somente os assassinatos, com aumento de 326,1%. Os dados fazem parte do Mapa da Violência 2013: Homicídio e Juventude no Brasil, publicado nesta quinta-feira (18), pelo Centro de Estudos Latino-Americanos.

Para o levantamento foram utilizados dados do Subsistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. De acordo com a publicação, do total de jovens com idade entre 14 e 25 anos que morreram em 2011, 73,2% chegaram a óbito de forma violenta.

O homicídio é a principal causa de mortes não naturais e violentas entre os jovens. Em 2011, a cada 100 mil jovens, 53,4 foram assassinados. No mesmo período, a taxa de mortes em acidentes de transporte, como carros ou motos, registrou 27,7 óbitos.

Segundo o Mapa, negros são maioria entre as vítimas de homicídio. De 2002 a 2010, dos 231 mil homicídios de jovens registrados, 122,5 mil eram negros, o que corresponde a 53%. No período, houve acréscimo de 18,4% nos casos de negros assassinados, enquanto entre os brancos ocorreu um decréscimo de 39,8%.

http://www.brasildefato.com.br/node/13651#.UfAmbRjG0uk.facebook

Marcha Mundial de Mulheres

Conexão musicultural

Por Nelson Augusto
Nelson Augusto

Como grande parte da população brasileira, eu também tive acesso primeiramente ao cancioneiro de Ednardo, através da criação do compositor cearense, “Pavão Mysteriozo”, a qual foi o tema central da trilha sonora da telenovela Saramandaia, em 1976, na Rede Globo do Televisão.

Na época, consegui o então vinil da novela, pois o elepê O Romance do Pavão Mysteriozo, lançado dois anos antes, em 1974, era difícil de encontrar nas lojas de discos. No álbum original de Saramandaia, a longa e criativa introdução inicial da composição foi cortada e Ednardo já começa cantando.

Só tempos depois, através de um amigo, Luiz Antônio Secundino (já falecido) que possuía o então primeiro LP solo do Ednardo, inclusive com o criativo encarte, nos moldes da literatura de cordel, gravei numa fita cassete, a obra completa e escutei o belo solo que inicia a canção que, primeiramente divulgou o maracatu cearense para o Brasil inteiro.

De tanto ouvir a tal da fita cassete com o álbum O Romance do Pavão Mysteriozo completo, decorei todas as letras e quando uma música acabava, no intervalo mudo eu já lembrava do início da outra canção. Tanto que, ao adquirir o álbum em CD, numa reedição de 2001, produzida por Charles Gavin, de imediato, notei que ele também mutilou parte da obra, quando cortou uma vinheta que existe no vinil, entre o final de “Avião de Papel” e o início de “Mais Um Frevinho Danado”.

A omissão deu-se por conta da exclusão de uma pequena composição, em que Ednardo, acompanhado do seu sonoro violão, canta, “É labareda, é labareda, é labareda, brasa e cinza”, palavras nas quais o artista celebra o nome de um dos livros de seu pai, o educador Oscar Soares Costa Souza, a publicação Labareda, Brasa e Cinza, lançada em 1979 durante a Massafeira Livre, no Theatro José de Alencar.

Quando da inauguração da Cidade 2000, na segunda metade da década de 1970, quando fui residir no conjunto habitacional do Papicu, conheci duas pessoas que tiveram uma relação direta com o trabalho de Ednardo: o Dudu (hoje apresentador de televisão e animador popular de eventos culturais, Eduardo Praciano) e o cantor, compositor, músico e arranjador Wilson Cirino, também integrante do Pessoal do Ceará.

O Dudu trabalhava na Emcetur e também atuava com peças de teatro e depois, chegou a participar como um dos produtores do Massafeira, fazendo parte inclusive, da trupe alencarina que foi para o Rio de Janeiro, gravar o tão sonhado álbum duplo de vinil. Lembro-me das nossas noitadas culturais, nas quais sempre gostávamos de cantar a música “Fênix”, do álbum Azul e Encarnado, lançado por Ednardo em 1977.
Com Wilson Cirino, que atualmente mora outra vez na Cidade 2000, além dos contatos musicais, nos quais ele sempre tocava seu violão e falava de suas atividades artísticas, quando vinha de férias para Fortaleza, sempre jogávamos futebol e tomávamos umas cervejas, após os rachas. Ao lado de Pepeu Gomes, Cirino fez os arranjos do disco Cauim, álbum que Ednardo gravou e lançou em 1978, pela Warner, atividade que, antes de acontecer, já tínhamos notícias.

Continuei adquirindo os discos seguintes – Ednardo (1979) e Imã (1981). Em 1981, quando fui para a Rádio Universitária FM, primeiramente como bolsista do Curso de Comunicação da UFC, de imediato levei minha coleção de elepês dele, para enriquecer o acervo da emissora. Foi a partir daí, que fiz as primeiras entrevistas com Ednardo, artista da música cearense que também se tornou meu amigo pessoal.

Tanto que, sempre que ele disponibilizava um álbum novo no mercado, fazíamos o lançamento, conversando sobre o processo de produção, e, tocando todas as faixas, num programa que ainda produzo e apresento todos os sábados ao meio-dia na Rádio Universitária FM, O Disco da Semana.

Quando do surgimento do CD, na primeira metade da década de 1990, através de um projeto de minha autoria, o “Memória 107”, cujo propósito é lançar no formato do Compact Disc, álbuns que foram gravados originalmente em vinil, sugeri ao Ednardo, fazer o lançamento do álbum Massafeira, no formato digital. Como as matrizes pertenciam ao acervo da atual Sony Music, através dos dados passados pelo Ednardo, contatei com a multinacional, a qual cobrou um preço fora do meu orçamento, para produzir mil cópias do álbum duplo coletivo, em CD.

Anos depois, em 2010, numa produção da Aura Edições Musicais, com organização de Ednardo, patrocínio do Banco do Nordeste e com chancela do Ministério da Cultura e o Governo do Estado do Ceará, através da Secretaria da Cultura, foi lançado o luxuoso livro/disco Massafeira – 30 Anos – Som, Imagem, Movimento e Gente.

A publicação tem vários depoimentos de participantes do movimento Massafeira, bem como textos de professores, estudiosos da cultura e jornalistas, além de fotos e vasto material impresso de publicações em outros veículos de comunicação. Serve de pesquisa para os interessados na história da música cearense, pois resgata um pouco da trajetória dessa geração de artistas alencarinos.

Nesses 40 anos de trajetória da carreira artística de Ednardo, resta-nos agradecer ao cantor, compositor que mais divulgou a riqueza da cultura musical cearense, tanto no que se refere aos seus ritmos, como principalmente o maracatu, quanto às mensagens das letras, nas quais, os lugares, personagens, expressões, usos e costumes cearenses, sempre são citados.

Na atual versão da telenovela Saramandaia, como não mantiveram a trilha sonora original, creio eu que a carga dramática dos personagens perdeu muito por conta do fio condutor imagem versus mensagem musical, não existir. No remake anterior da Globo, Gabriela, as canções originais foram aproveitadas outra vez e o resultado foi fantástico. Acredito que, apesar da nova roupagem de Saramandaia ser “livremente inspirada na obra de Dias Gomes”, como denunciam os créditos na tela, João Gibão sem o “Pavão Misteriozo” e o Professor Aristóbulo sem “Canção da Meia-Noite” (Almôndegas), por exemplo, nunca vão retratar a realidade fantástica que o autor escreveu em seu texto.

Espero que o show de Ednardo, próximo dia 27, no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, com o auxílio luxuoso de excelentes instrumentistas e cantores cearenses e a participação especial do paraibano Chico César, seja um sucesso também de público. Como o espetáculo que vai ser filmado e transformado em um futuro DVD, as novas gerações poderão ter um documento sonoro e musical representativo da obra do compositor mais representativo da cearensidade cultural contemporânea. Para os admiradores antigos, pela primeira vez terão um documentário de qualidade da obra do autor de “Beira-Mar”.

Nelson Augusto é jornalista e radialista da Universitária FM e editor de conteúdo de www.nelsons.com.br, site que brevemente implantará uma web rádio com foco também para a música cearense.

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2013/07/20/noticiasjornalvidaearte,3095386/conexao-musicultural.shtml

Entre luzes que lhe escondem

Dalwton Moura

No calor desta efeméride, em meio ao reconhecimento à vasta e notável obra de Ednardo (e à necessária discussão sobre a renovação, reafirmação ou estagnação dessa obra, nas últimas décadas), cumpre destacar um outro aspecto da atuação do artista. Não o cantor e compositor, nem o produtor responsável, ao lado de Augusto Pontes e de tantos outros, pelo caleidoscópio de linguagens e expressões da Massafeira Livre, embora ele permaneça indissociável dessa condição. Mas o aglutinador responsável por um dos mais significativos registros sobre a música cearense, na forma de livro.

Falamos de Massafeira – 30 Anos, publicação de fôlego, lançada em 2010, como um imprescindível registro de muitos dos infinitos ângulos possíveis da “marmota do mormaço”, a história enriquecida pelos testemunhos dos que a vivenciaram, mas também de várias visões sobre aquela tentativa de inserção de novas e numerosas gerações de músicos do Ceará na faixa de visibilidade da música nacional.

É sintomático que, tanto tempo e tantas mudanças depois, entre fronteiras dissolvidas e a reinvenção dos próprios modos de produção, distribuição e consumo musical, a música feita no Ceará siga enfrentando desafios semelhantes aos de décadas anteriores, quanto à sua difusão para públicos mais amplos, aqui e em outros cenários, e à sua validação na mesma medida de sua qualidade e sua diversidade. Um mergulho nas causas dessas limitações demandaria um grande debate, mas parece claro que o caminho para superá-las passa por alguns pressupostos, entrelaçados justamente na construção dessa afirmação.

Se a geração de Ednardo, Belchior, Fagner, Rodger Rogério, Téti, Cirino, Brandão, Fausto Nilo, Ricardo Bezerra, Dedé Evangelista, Tânia Cabral, entre outros nomes de destaque, permanece, ainda e para muitos, como referência mais imediata quando se fala em “música cearense”, as várias gerações que a sucederam encontraram diante de si, em diferentes níveis e contextos, a tarefa de inventar sua própria estrada. Muito mais que fáceis e superficiais generalizações do tipo “depois deles, não apareceu mais ninguém”, há que se buscar compreender o porquê de certas dificuldades persistirem por tanto tempo e permearem a trajetória de tantos artistas, mesmo aqueles com mais claro potencial de comunicação e mercado.

As tramas dessa teia se tornam mais complexas à medida em que, no plano local, vivemos ainda a construção de uma cena, o esboço de uma indústria cultural minimamente sustentável como tal. Enquanto isso, no âmbito geral, as configurações da música se modificaram tão rápida e profundamente que mesmo cenários e protagonistas de há muito estabelecidos se viram fadados a reinventar-se ou desaparecer. De todo esse processo, a concorrência aumentou e a diversidade emanou como um “efeito colateral” – extremamente saudável para o público ativo o suficiente para garimpar novos nomes. Positivo também para os artistas que compreendem essa realidade e desenvolvem, na medida da perna de cada um, os instrumentos para nela atuar. Mesmo assim o nome, a fama, os milhões de discos vendidos em um ontem distante, a consagração em diferentes níveis permaneceram como valiosos distintivos nas prateleiras virtuais.

A quem não detivesse tal condição, restava a luta pela etiqueta do novo, da “tendência”, do “artista em ascensão” ou de “um novo nome promissor”. E é exatamente aqui que os caminhos dessa história se encontram. Nossos novos nomes seguem necessitando de instâncias de consagração, de parâmetros de validade, de chancelas que os coloquem em pauta e os legitimem perante um público maior. A escassez de bibliografia sobre o cenário da música no Ceará é um dos sintomas dessa cena ainda em construção. Se ainda lutamos para ter mais produtos musicais – discos, singles, shows, clipes, turnês – bem acabados e divulgados, com regularidade e visibilidade, terminamos por cultivar um quê de incompreensão diante de inúmeros nomes com grande potencial que não conseguem – por quê? – sedimentar as necessárias pontes até maiores audiências.

Pois bem. Massafeira – 30 Anos, o livro, ou projeto multimídia, é uma louvável exceção a essa regra. Ousa destoar do coro do “quase”, do “médio”, do “possível”, para afirmar que a música feita no Ceará merece, sim, um registro em centenas de páginas em couché e capa dura. Trata-se de um olhar em retrospecto que sugere muitos e importantes pontos para essa discussão. Mas principalmente coloca em perspectiva a música de um Ceará grande, destoando da leitura, exposta por parte da imprensa, de que aquela teria sido uma geração “abortada”, sufocada entre o sucesso reluzente do “Pessoal” e as mudanças de cenário que travaram o jogo.

Outro bom debate. Independentemente dele, porém, é inegável que o livro cumpre uma tarefa importantíssima, ajudando a aguçar o olhar e a provar que é possível, para esta mesma geração e para aquelas que a ela se seguiram, ver sua história contada de forma respeitosa e atraente. Ter ao menos o benefício da dúvida. Contar com um registro à altura da repercussão que, afinal, a Massafeira de Ednardo, Augusto, Brandão e muitos outros teve para muitos.

Os ecos da Massafeira chegaram a muitos outros potenciais ouvintes e novos irradiadores através da publicação, que bem pode merecer suas críticas, pela ausência, mesmo intencional, de maior ordenamento, pelo espaço para alguns nomes deslocados, pela ausência de outros. Mas, desde a capa em vermelho com o infinito tracejado nos chifres do carneiro estilizado por Brandão, o livro sugere muito mais a verborragia que a síntese, o múltiplo que o individual, a hipótese que a conclusão. Apesar de ter sido organizado por Ednardo e idealizado também por Julia Limaverde (filha do cantor), são as várias vozes sobre a Massafeira as responsáveis pelo encanto do livro. Do palco à academia, de 1979 a 2010, do TJA ao Dragão do Mar, da Massafeira ao Manifesta.

Outro grande trunfo da obra é o precioso acervo fotográfico de Gentil Barreira sobre a Massafeira, em 1979, e a posterior viagem dos cearenses ao Rio de Janeiro, para a gravação do que viria a ser um marcante, embora problemático, álbum duplo. Os fotogramas daquela efervescência revelam desde o “Pessoal” até os novíssimos músicos que reclamavam espaço para o rock e o blues, em meio ao telúrico, ao lírico, aos tons menores da tradicional canção cearense. Todos e cada um foram registrados pelo olhar de Gentil, em fotos em preto-e-branco, mas plenas de matizes na linguagem, nos detalhes, nas leituras, nos desejos. São os longos cabelos de Ife ou de Klaus Voormann a empunhar o contrabaixo? São Waters, Mason, Gilmour, Barrett e Wright ou Téti, Rodger, Stélio, Régis e Luiz Miguel a se debruçar sobre os botões da mesa de som? São os punks londrinos ou os jeans e olhares de Mona Gadelha e Lúcio Ricardo? Paralelos que brotam das imagens.

Outra oportunidade que justifica a viagem é a de (re) ouvir os dois LPs da Massafeira, transpostos para CDs a realçar o brilho de eternas joias, como “Vento-rei”, “Aurora”, “Pé de espinho”, “Aviso aos navegantes”, “Cor de sonho”, “Último raio de sol”... Patativa em “Senhor doutor”, Ana Fonteles e Ednardo em “O sol é que é o quente”, Téti e Tânia Cabral em “O rei”, Ângela Linhares em “Como as primeiras chuvas do caju”. É, faltou “Frio da serra”, gema da lavra de Petrúcio Maia e Brandão... Mas esta vale o esforço de procurar logo ali.

Entre virtudes e limitações, o livro organizado por Ednardo e tecido a inúmeras mãos demonstra um nível de valorização que, infelizmente, ainda destoa daquilo a que a música feita no Ceará está acostumada. Precisamos de mais registros como este, mais publicações que digam das asfixias e dos paradoxos mas também da verdadeira riqueza de nossa música. Que possibilitem abreviar o hiato de informações entre passado e presente, descortinando nossa trajetória, em boa medida ainda a ser contada. Porque, apesar das luzes que lhe escondem, essa história segue se refazendo em novas canções. E tem cada vez mais pressa de continuar.

Dalwton Moura é jornalista, escritor e crítico musical. Autor do livro Nos Acordes do Jazz & Blues -Memórias do Festival Jazz & Blues de Guaramiranga (2013).

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2013/07/20/noticiasjornalvidaearte,3095390/entre-luzes-que-lhe-escondem.shtml

segunda-feira, 22 de julho de 2013

A alegria que existe

Por Mateus Perdigão

O carnaval é um tema presente – e recorrente – na obra dos grandes compositores do cancioneiro popular brasileiro. Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Alceu Valença, dentre vários outros artistas, já escreveram músicas para o carnaval ou usaram-no como pano de fundo nos versos de suas canções. A presença deste tema em suas obras artísticas não acontece à toa, ele é uma das maiores manifestações culturais de nosso País, em que pese toda sua heterogeneidade, complexidade e diferenças locais.

Com Ednardo não poderia ser diferente. Dentro do rol dos grandes compositores brasileiros, o carnaval foi tema de algumas de suas canções. Apesar de não ser o tema central de sua obra, ele merece atenção pois faz parte de uma visão maior que o compositor tem sobre Fortaleza e sua história. Entender o carnaval na obra de Ednardo, de certa forma, é pensar o carnaval de Fortaleza.
Ednardo


Dotado de uma sensibilidade e uma percepção estética singular, Ednardo canta o carnaval de uma forma em que ele não apareça apenas de forma descritiva, mas através de uma perspectiva histórica. Ele aparece em sua obra através de um olhar crítico de quem viveu e vivenciou diferentes experiências carnavalescas. E o carnaval em Fortaleza tem como um dos principais expoentes o maracatu.

A ligação de Ednardo com o maracatu começou ainda na infância, por volta dos cinco ou seis anos de idade, quando seus pais o levaram para ver a concentração dos maracatus no Parque da Liberdade. De lá, seguiu os cortejos até o Passeio Público que, depois, seguiu pela rua Senador Pompeu. Na ocasião assistiu e se encantou com os cortejos dos maracatus Estrela Brilhante, Az de Espada e Az de Ouro, que desfilavam pela rua pouco iluminada carregando os próprios candeeiros, num batuque envolvente.

O Estrela Brilhante foi, nas recordações do compositor, o primeiro maracatu que ele viu. Ainda criança seguiu o cortejo por entre as pessoas, levando seus pais à loucura, que o procuraram por aproximadamente meia hora pela multidão. Além de ser uma boa recordação de infância, o Estrela Brilhante foi tema de uma canção sua, gravada no disco Imã, em 1980. Nesta canção, Ednardo buscava homenagear um dos períodos mais férteis do maracatu cearense: “Maracatu estrela brilhante/ Maracatu o teu brilho errante/ Gamela da nossa mistura/ Tão linda tão mista tão pura/ Maracatu/ Garra maracá já guerreiro/ Batuque ferro e ganzá/ A flecha cravada no céu brasileiro/ Infinita mente cantar / Cantar/ Cantar”

Quando o local do desfile dos maracatus deixou de ser na rua Senador Pompeu e passou a ser na Avenida Duque de Caxias houve um certo esvaziamento do carnaval de Fortaleza e uma tendência a desvincular os maracatus do carnaval da cidade – por motivos inclusive políticos. “Mais um Frevinho Danado” é uma canção de Ednardo gravada na década de 1970, no disco O Romance do Pavão Mysterioso, que narra o início desse esvaziamento: “No espaço curto desse passo louco / vou sair um pouco pra esquecer o triste / se eu lhe encontrar pelo meio desse povo / vou lembrar de novo que a alegria existe”. Outra canção que fala do mesmo assunto é “Maresia”, gravada no disco O Azul e o Encarnado, de 1977: “A calmaria da cidade é geral/ É geral, é geral/ E a maresia que molhou a minha pele / Rimou com a canção pra este carnaval/ Nada me resta a não ser tua beleza / E a incerteza do que vai ser de mim/ Por isso basta dessas coisas sérias (...)”

Outra canção que merece destaque no seu repertório carnavalesco é o frevinho “Bloco do Susto”, gravado no disco Cauim, de 1978.
Ednardo é um entusiasta do maracatu cearense e do carnaval de Fortaleza. Sempre atento às manifestações culturais e todas as transformações que ocorreram no passado, com certeza ele está atento a este novo fôlego que o carnaval de Fortaleza tem tomado. Que os atuais blocos, escolas de samba, afoxés e maracatus se inspirem em suas canções para não mais deixar a calmaria na cidade ser geral, mas que permitam que todos nós possamos sair fantasiados de alegria por aí.

Mateus Perdigão é sociólogo, um dos fundadores e músico do Bloco Luxo da Aldeia que surgiu em 2006, no Benfica, com a proposta de reunir foliões em torno de canções de compositores cearenses.

terça-feira, 16 de julho de 2013

sete cenas de imyra - Taiguara

Por Marcus Vinicius

Excelente vinil de Taiguara - 1976







Clara Crocodilo - com Arrigo Barnabé e banda sabor de veneno

Por Marcus Vinicius

Desde Fortaleza este LP foi o que mais me deu trabalho pra comprar. Ano 1980. Independente.

AZULÃO - MANUEL BANDEIRA E JAYME OVALLE

Eliete Negreiros canta Azulão

Por um acervo permanente da música digital e analógica

Por Jarmeson de Lima


Ilustração por Karina Freitas

É inegável que o suporte digital facilitou – e muito – a vida da gente. Por conta da praticidade dos mecanismos portáteis, temos agora uma infinidade de registros, sejam eles textos, fotos, vídeos ou músicas. A música, por sinal, por ser uma manifestação artística imaterial e não palpável, precisa ser capturada em materiais palpáveis. Diferente de outras formas de arte, ela não dispõe de um aparato físico e concreto que podemos ver ou tocar. É possível reproduzir ou esboçar uma pintura através de desenhos ou de uma fotografia, e, então, poder apreciá-la indefinidamente.
No caso da música, isso é mais complicado. Você pode pegar num violino, mas ele por si só não toca música alguma. Graças à criação e à evolução do fonógrafo de Thomas Edison, dispomos de tantos mecanismos de gravação e reprodução sonora. A maior parte desses mecanismos está condicionada, entretanto, a aparelhos físicos para reproduzir a música que queremos, mesmo sendo ela códigos binários processados por computador.
No entanto, em algum momento, esse acervo que está sendo migrado lentamente para a “nuvem”, pode correr o risco de não ser mais acessado. Temos essa rede digital com bilhões de dados correndo soltos por wi-fi, cabo e satélite, mas que pode não valer nada daqui a um tempo.
Quando a Nasa nos alertou sobre o risco de uma tempestade solar e a perda temporária de comunicações, isso mostrou o quão frágil pode ser a conservação de dados digitais. E o mais grave é que isso pode acontecer sem que a gente veja de fato o que ocorreu. Afinal, a radiação é invisível aos nossos olhos e tais ocorrências podem se dar a qualquer instante. Vale lembrar que os aparelhos de raio X presentes nos aeroportos foram responsáveis por estragar o trabalho de muitos profissionais ao danificar cartões de memória e HDs.
A confiança exclusiva no digital tem esse risco. Por outro lado, a praticidade de possuir mais de 10 mil arquivos de música, fotos e filmes em um só pen drive, no lugar de 10 estantes de CDs, discos e DVDs, compensa, se você mora nos imóveis atuais, com menos de 70m². O problema é que os produtores e compositores da nova geração artística estão perdendo a vontade ou o costume de reproduzir sua música em formato “analógico”. A prensagem de CDs em tiragem industrial ainda é cara e tem um retorno incerto. Mas é importante fazer? Sim! Mesmo em escala reduzida, é necessário ter um registro físico da música desta época e em boa qualidade. Senão o breve episódio da história da música recente corre o risco de se perder.
Por mais que os artistas lancem discos diretamente na iTunes Store ou cineastas façam filmes com lançamento digital, quem garante que esse acervo ficará disponível daqui a três, oito ou 20 anos? Se o futuro das mídias e dos equipamentos que reproduzem música é incerto, quem garantirá a perenidade dos formatos MP4, MP3 ou WMA?
A TRAMA

O fato é que nossa crença no futuro – que demora a chegar – nos torna despreocupados com o legado artístico e a manutenção de um acervo que deveria ser obrigatório. Até o fim de março, a Trama Virtual era o maior repositório de músicas da cena independente do país, principalmente de bandas nascidas entre 2000 e 2010. Muitas delas nem chegaram a gravar um disco oficial, mas fizeram carreira e um relativo sucesso apenas com arquivos em MP3.
Eram 78.731 artistas e 205.381 músicas cadastradas no portal, embora não detivesse o maior acervo musical de artistas brasileiros. Outros sites e serviços, como o Palco MP3, possuem tecnologia e um número similar de artistas, mas não agregavam conteúdo ou divulgavam seus produtos como fazia a Trama, que ainda dispunha de jornalistas para produzir notícias e um programa de TV que chegou a passar algumas temporadas no canal Multishow e na TV Cultura.
Como se não bastasse esse esquema de autopromoção, o portal também criou um novo modelo de negócios que parecia ser o futuro para o problema de pagamento de artistas na internet. Através do sistema de “download remunerado”, os grupos que tivessem mais músicas baixadas poderiam ganhar dinheiro. Ou ter direito a isso, uma vez que sua remuneração mensal viria de um cálculo entre o valor total do patrocínio do portal e de outras empresas com relação aos mais acessados de acordo com o número total de downloads de maneira proporcional. No entanto, com o passar dos meses, a verba disponível foi diminuindo e, com isso, o interesse das bandas em permanecer ali. Obviamente, quem já estava por lá deixou suas músicas, mas quem tinha chegado recentemente não se empolgou em disponibilizar suas obras.
Agora, com o fim do portal, para onde foram esses registros? Se formos otimistas, podemos crer que todas as bandas que largaram suas músicas por lá mantiveram ainda seus backups e, em breve, vão disponibilizar suas obras novamente na internet, em sites semelhantes. Se formos pessimistas, teremos que catar um a um, em diferentes acervos particulares, os principais nomes dessa biblioteca virtual.
Em meio a tal contexto de incertezas, temos que louvar a iniciativa de pessoas como os norte-americanos Bob George e David Wheeler (já falecido), que criaram um museu da música contemporânea, em 1985. O ARChive of Contemporary Music (arcmusic.org) é uma coleção de fonogramas mantida de forma independente e construída através de doações do mundo inteiro, contendo atualmente mais de cinco milhões de itens, entre LPs, compactos, CDs e outros formatos de música gravados a partir de 1940.
Sua sede, em Nova York, contém todas as raridades previstas na história da música contemporânea. A ação merecia ser copiada também no Brasil, para além dos registros que existem na Biblioteca Nacional. E, num país onde a memória é precária e a preservação do patrimônio ainda pior, uma iniciativa como a Trama Virtual deveria ser tombada e guardada como um retrato do passado recente que corre o risco de se perder em meio à efemeridade da internet.

CASAMENTO DE BEATRIZ BARATA: NOSSO 14 DE JULHO, NOSSA BASTILHA CARIOCA!

Por Hildegard Angel

Tendo o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e sra., como padrinhos, e como convidados os colecionadores de arte Sergio e Hecilda Fadel, que recentemente receberam a presidenta Dilma Rousseff para jantar em casa, no Rio, e cuja filha é casada com o filho do ministro Edison Lobão, das Minas e Energia, além do colunista social de Fortaleza, Lalá Medeiros, casaram-se ontem, com festa que varou madrugada, no Copacabana Palace, Beatriz Barata, neta do maior empresário de ônibus do Rio de Janeiro, Jacob Barata, e Francisco Feitosa Filho, cujo pai é o dono da maior empresa do ramo no Ceará.

Acompanhar, via mídias sociais e MSMs recebidos, o protesto indignado contra este casamento diante da Igreja N. Sra. do Monte do Carmo e da festa no Copacabana Palace, me fez sentir clima de Revolução Francesa, correndo um frio na espinha, um presságio ruim. E me veio à mente a princesa de Lamballe, melhor amiga de Maria Antonieta, com a cabeça espetada na ponta de uma lança, pela multidão que invadiu asTulherias.

Estávamos numa madrugada de 14 de Julho, mesma data da Revolução Francesa, e toda aquela manifestação, que ontem começou alegre, até divertida, berrando bordões bem humorados, outros de gosto duvidoso, teve consequências desastrosas, com cabeça ensanguentada, decisões equivocadas, batalhão de choque, bombas de gás lacrimogênio, balas de borracha e gás de pimenta, às 3,30h, 4h da manhã, diante de nosso Palácio de Versailles, emblema máximo do luxo, da riqueza e da sofisticação do país: o Hotel Copacabana Palace!

Vou contar como foi, tal e qual… Aquietem-se, concentrem-se e me escutem…

Com gritaria na calçada, o protesto diante da igreja causou tensão nos convidados, perturbou todo o tempo o ofício do padre e a noiva, Beatriz, em vez de cortejo de daminhas e pajens, precisou de cordão de isolamento para entrar na igreja.

Enquanto padre Alexandre fazia a homilia, escutava-se nitidamente os manifestantes em coro dizerem coisas como “ha,ha, ha, o noivo vai broxar”, “também quero meu Louboutin”, “úúú, todo mundo pra Bangu” e tambores, buzinas e panelas, pó-pó-pó-pó-pó, pó-po-ro-po-pó, fon-fon-fon etc. O cerimonial de moças e rapazes impecáveis, pra lá e pra cá, cochichando baixinho, apreensivos sobre como solucionariam a saída dos noivos. Foi com PM e seguranças.

Beatriz, calada e retraída, permaneceu tensa todo o tempo – pudera! – mas manteve o controle. Foi altiva.

Já na recepção, no Copacabana Palace, todos se descontraíram e puderam se divertir, porque no interior do hotel não se percebia o que se passava lá fora, à exceção daqueles nas mesas da varanda.

No calçadão da Atlântica, uma garotada bonitinha da Zona Sul fazia manifestação até divertida, à la carioca, com meninas vestidas de noiva, rapazes alguns de terno e gravata, sacando bordões inspirados como “Eu também quero meu Louis Vuitton”, “Cadê minha Chanel?”, “Nesse hotel tem Barata!”, “Eu também paguei essa festa, quero meu bem-casado” e aquele clássico chulo da noite, citado acima, que se referia ao noivo…

E dá-lhe buzina, bateção de panela, de tabuleiro de alumínio, e desacatos para as mulheres (lindas!), que entravam ou saíam decotadas, cobertas de bordados: “piraaaaaanha!”. Não poupavam ninguém.

Com todas as quatro entradas do hotel bloqueadas por eles, ninguém entrava, ninguém saía, pela internet, os seguidores que assistiam à transmissão do canal “Mídia Ninja” postavam comentários mais pesados, do tipo “CABRAL VAI É DORMIR AÍ !!!!” (detalhe: Cabral sequer figurava na lista de convidados da festa!); “cadê as bombas???chama pa nois estraga a festa!”; “BA-FO-ME-TRO NO HOTEL”; “Rico não tem Lei Seca?” (referindo-se aos que embarcavam em seus carros mesmo aparentando ter bebido, quando ainda se podia sair); “chocada com o valor dos presentes que a Baratinha pediu no casamento. Veja a lista: http://migre.me/fsCZL” (localizaram a lista no site da H. Stern); “Candidato da Baratinha é Marcelo Freixo do PSOL” (foram checar no Face de Beatriz e descobriram); “ISSO.. TEM QUE JOGAR OVO MESMO…” (zangados porque a repórter foi maltratada por um policial à porta); “Todos RATOS engravatados, saindo pelos fundos constrangimento é a única arma do povo!!” (houve uma hora em que os convidados conseguiram sair pela porta da Av. Copacabana); “deixem suas mensagens de parabéns ao noivo”.

Vou omitir palavrões, baixarias e violências. Se é que já não transcrevi demais disso.

A horas tantas, chegou ao hotel a diretora-geral, Andréa Natal, que por força do cargo mora no Copa. Entrou pela porta lateral da Pérgola, junto ao Edifício Chopin. Aflita, vendo aquela multidão e a gritaria, parou para discutir com os manifestantes, iniciando rápido, bate-boca, logo sustado pelos seguranças, que a transportaram para dentro.

No interior do hotel mais lindo do Brasil, tudo eram maravilhas. No Golden Room, a apoteose do deslumbramento. O decorador Antonio Neves da Rocha plantou no meio do salão uma árvore frondosa, com os galhos alastrando-se por toda a área do teto, de onde pendiam fios com lampadário e buquês de flores. O chão coberto com grama. E a iluminação causava a sensação de se estar numa floresta-lounge, com estofados pretos.

Ali foi o show de Latino, que para entrar só conseguiu pela porta de serviço da Rodolfo Dantas, a da cozinha, driblando os manifestantes. Depois do bundalelê do Latino, houve ali a dança, com o DJ Papagaio e sandálias Havaiana vermelhas para todos os 1050 convidados que compareceram. Foram expedidos 1200 convites. Havia lugares sentados para todos, absolutamente todos.

No Salão Nobre, aquele comprido que sucede ao Golden Room, Neves da Rocha cobriu toda a parede de janelões que dá pra piscina com imenso painel único de Debret (ou seria Rugendas?) com super-mega-imensa-paisagem do Rio de Janeiro, abrangendo nossas montanhas, o mar, a Baía, florestas, do teto ao chão, criando visão fantástica.

Completavam o ambiente lustres enormes cobertos com heras, toalhas de damasco verde musgo cobriam as mesas até o piso.

O mesmo décor de toalhas musgo de damasco se repetia nos salões da frente e nas duas varandas, que foram cobertas e fechadas com paredes de muro inglês, com heras, e os mesmos lustres espetaculares. Cadeiras de medalhão suntuosas. Muito bonito.

Entre os três salões da frente, o do meio foi destinado a ser apenas o Salão dos Doces, com bem-casados da Elvira Bona, doces de Christiana Guinle, chocolates de Fabiana D’Angelo. Chá, café, brownies. O Céu, a Terra e o Mar também…

O champagne era Veuve Clicquot. Uísque Black Label. Aqueles coquetéis de sempre, Bellini, Marguerita etc. Vários bares de caipirinha, saquê etc. O bolo de Regina Rodrigues era um acontecimento, com vários andares, todo branco.

Buffet do Copacabana Palace, muito bem servido e elogiado. Na verdade, eram vários buffets, distribuídos por todos os salões e varandas. Mesas de frios. Pratos quentes. O cerimonial foi de Ricardo Stambowsky. As fotos, de Ribinhas.

Flores de Raimundo Basílio. Não houve exagero de flores, o verde deu o tom. Uma decoração em que prevaleceram o equilíbrio e a elegância. Luxo sem excessos.

Todo esse décor serviu de cenário à mais fantástica coleção de vestidos jamais reunida numa festa no Rio de Janeiro. Esta a opinião que ouvi de vários que lá estiveram, quer como convidados, quer prestando serviço ao evento. Um especialista em moda, que pediu para não ser identificado, falou: “Nunca vi tantos vestidos deslumbrantes como nessa festa. E de gente que ninguém conhece”. Acredita-se que a grande maioria das mulheres com essas roupas sensacionais, vestidos de alta costura, grandes marcas, fosse de convidadas do Ceará, que ocuparam vários apartamentos no hotel. O Copa bombou na festa e na ocupação.

Não apenas os vestidos eram extraordinários. As joias eram também fantásticas. A começar pelas da noiva, usando riviera de brilhantes fantástica no pescoço, dois enormes brilhantes nas orelhas e uma coroinha de ouro e grandes brilhantes, na cabeça, sempre usada pelas noivas da família. O vestido de Beatriz Barata foi obra da estilista Stela Fischer.

Tudo isso foi coordenado pela avó, Glória Barata, que durante a festa várias vezes se lembrou do filho assassinado naquela época da onda de sequestros no Rio de Janeiro. A família pagou o resgate, mesmo assim o jovem não foi poupado. Ela ainda guarda um grande sofrimento. Dona Glória é uma mulher sofrida e amável. Todos os que trabalham com ela e sua família a estimam.

Enquanto o minueto social seguia harmonioso, farfalhante e cintilante, entre as mesas de toalhas verde musgo adamascadas dos salões, no entorno do hotel, a contradança era outra.

Não têm pão? Comam bem-casados! Da varanda, convidados rebatiam as provocações verbais atirando bem-casados na “plebe” (bem à la Maria Antonieta, que ofereceu bolinhos, lembram?) e remetiam aviõezinhos de notas de R$ 20 (aí, a inspiração já era mais próxima, à la Silvio Santos).

Num crescendo dos protestos, bate panelas, mensagens de Face e Twitter, imagens postadas, provocações, bordões, os ânimos foram se acirrando e não houve nada que se tentasse para apaziguá-los. Ao contrário.

Na portaria do hotel da Av. Copacabana, o motorista de um dos convidados arrancou o celular da repórter “Ninja”, que, como Ninja, deu um salto e conseguiu recuperá-lo, botando o elemento pra correr. Ela recorreu a um policial, que a tratou com impertinência, parecendo alcoolizado. Tudo isso registrado pela câmera Ninja. E a rede social participando, reagindo, se indignando.

Em seguida, correm todos para a Atlântica, prosseguem a gritaria. Uma convidada insiste em deixar o hotel, é impedida e inicia uma briga, quando um convidado, lá da varanda, atira um cinzeiro de vidro na cabeça de um manifestante, que se fere muito.

Vendo aquela imagem ensanguentada na tela da internet, a galera começa a postar desacatos enfurecidamente. A repórter corre para buscar socorro na ambulância de plantão diante do hotel (é lei quando se trata de evento com mais de 600) e o paramédico. Mas o médico não está, “foi lá dentro”. O rapaz machucado tenta entrar no hotel para ser socorrido. Os seguranças e porteiros impedem sua entrada. Está aí cometido o grande erro da noite!

O Copa, neste momento, rompe sua tradição histórica de cordialidade com a população carioca e de diplomacia e assume uma postura hostil.

A multidão na rua se enfurece. A multidão virtual também e passa a convocar o envio geral de comentários negativos à página do hotel na internet. Uma guerra aberta contra o maior tesouro da hotelaria brasileira! Eu, confesso, quase choro. Adoro o Copa. O Copa é o Rio, nossa memória, nossa História.

Mais uns 10, 15 minutos, e chega ao local uma advogada dizendo-se da OAB, localiza uma testemunha da agressão, consegue recolher a “arma do crime”, fragmentos do cinzeiro que atingiu o rapaz, leva os dois para a delegacia, onde faz o registro da ocorrência: “tentativa de homicídio”. A vítima leva seis pontos na cabeça.

Juan Nascimento, o rapaz atingido pelo cinzeiro

A garotada agitada continua nos impropérios, constrangimentos e panelaço, e eis que, quase quatro da manhã… chega o BOPE, marcando sua forte presença de sempre, soltando bombas de gás lacrimogênio, atirando com balas de borracha e, para completar a apoteose da alvorada dessa Bastilha carioca, espargindo spray de pimenta a torto e à direita.

Nessa altura, a multidão de manifestantes, que às três e meia da manhã já estava reduzida a uma centena, ficou ainda menor. Eram apenas uns 50 mais experientes, já com suas máscaras anti-spray nos rostos.

Enfim, os últimos convidados, que aguardavam no foyer do hotel pela oportunidade de deixar a festa, conseguem partir. Vão deixando o casamento Barata e tossem, viram os olhos, engasgam com o spray de pimenta. Os manifestantes de máscara anti-spray gozam, a repórter estica o microfone: “Tá gostando, cara?”.

Foi um acontecimento totalmente atípico, inédito. Já houve manifestações de protesto em casamentos de políticos e pessoas importantes. Como no da filha do senador Álvaro Pacheco, décadas atrás, tendo José Sarney, presidente da República, como padrinho, na Igreja do Largo de São Francisco.

Mas nada, jamais, em tempo algum, se comparou à ferocidade do acontecimento irado deste 14 de Julho carioca, em nosso Versailles, o Copa, que, ainda bem, nada teve de noite de Tulherias nem de cabeça espetada em ponta de lança. Mas teve cabeça rachada de manifestante. O que já foi um triste começo.

PS: O parágrafo final foi modificado em 15/07/2013, às 13:02, por livre e espontânea vontade da autora