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quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Lugares curiosos

por Márcio Cotrim














Rio das Velhas (MG)

O leitor amigo João Carlos Teixeira da Costa, de Belo Horizonte (MG), traz uma boa curiosidade. Na cidade de Santa Luzia, nas proximidades da capital mineira, corre o rio das Velhas. Num dado ponto dele, era comum aparecerem enxames de abelhas. Os muitos portugueses que por ali passavam frequentemente chamavam o rio, no típico sotaque lusitano, de "rio das avelhas", forma comum de dizer "abelhas" em Portugal. Para chegar a "velhas" foi um pulo, e lá estão elas, as velhas, dando nome ao rio.

Viaduto dos Cabritos (RJ)
Já no Rio de Janeiro, há um logradouro oficializado pela prefeitura com a denominação de viaduto dos Cabritos. Construído na Via Dutra, sobre a avenida Brasil, nas proximidades da fábrica da Ambev em Campo Grande, recebeu o nome de viaduto Engenheiro Oscar Brito, só que o povo logo o abreviou para Viaduto Oscar Brito - que acabou virando "viaduto dos cabritos".

Vila Valqueire (RJ)
Também no Rio, há um bairro chamado Vila Valqueire. Seu nome, originalmente, designava a quinta parte, em alqueires, de um grande loteamento, e como "cinco" em algarismos romanos é V, acabou dando nome a um aprazível recanto da Cidade Maravilhosa...

Ilha de Guaratiba (RJ)
Os cariocas apreciam um lugar chamado Ilha de Guaratiba - que, na verdade, não é ilha. A culpa da confusão é de um gringo que morou lá chamado William e era uma espécie de cocada preta do pedaço, dono de propriedades na região. Mandava em tudo. Como pronunciar o nome do sujeito ficava meio complicado, William virou ilha e as terras dali passaram a pertencer ao "seu" Ilha de Guaratiba, que tal?

Haddock Lobo (SP/RJ)
Você sabe quem foi Haddock Lobo, nome de uma importante rua tanto no bairro da Tijuca, no Rio, como numa travessa da avenida Paulista, em São Paulo? Foi simplesmente o homem que aplicou a primeira anestesia no Brasil.

Sua excelência, o leitor

Por Cristovão Tezza

"Os livros vivem fechados, capa contra capa, esmagados na estante, às vezes durante décadas - é preciso arrancá-los de lá e abri-los  para ver o que têm dentro. [...]
Já o jornal são folhas escancaradas ao mundo , que gritam para ser lidas desde a primeira página. As mãos do texto puxam o leitor pelo colarinho  em cada linha, porque tudo é feito diretamente para ele. O jornal do dia sabe que tem vida curta e ofegante e depende desse arisco, indócil , que segura as páginas amassando-as, dobrando-as, às vezes indiferente, passando adiante, largando no chão cadernos inteiros, às vezes recortando com a tesoura alguma coisa que o agrada ou o anúncio classificado. Súbito diz em voz alta, ao ler uma notícia grave, "Que absurdo!", como quem conversa. O jornal se retalha entre dois, três, quatro leitores, cada um com um caderno, já de olho no outro, enquanto bebem café. Nas salas de espera, o jornal é cruelmente dilacerado. Ao contrário do escritor, que se esconde, o cronista vive numa agitada reunião social entre textos - todos falam em voz alta ao mesmo tempo, disputam ávidos o olhar do leitor, que logo vira a página, e silenciamos no papel. Renascemos amanhã".

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

PRAZER - DIUMTUDO 2013


100 Memoráveis Canções Brasileiras

Via Fulano e Sicrano

Lauro Lisboa Garcia, uma super-hiper-gigantesca autoridade em crítica musical, achou de preparar e publicar no Facebook uma lista pessoal com 100 memoráveis canções brasileiras, mencionando as interpretações que mais agradam a ele, tendo o cuidado de escolher apenas uma canção por autor, uma custosa tarefa vez que temos tantos magistrais autores.

Como adorei a lista, e estou saindo uns dias pra descansar levando na minha bagagem o meu iPod, eu a inclui na mochila e resolvi compartilhá-la com vocês, ressalvando a possibilidade de algum engano já que posso ter inadvertidamente escolhido uma versão diferente daquela imaginada por ele.


Uma única exceção: a canção 73 “Noite Sem Luar”, com Eugénia Melo e Castro, gravada em estúdio, que está no CD “Lisboa Dentro de Mim” e que não houve meio de obter, mas que prometo adicionar assim que tiver sucesso. E não há mais exceção, já que a faixa faltante já nos foi encaminhada pela Eugénia, a quem agradecemos honrados e de joelhos.

O link está abaixo (a canção da Eugénia em separado) e a lista de canções, autores e intérpretes está detalhada no espaço de comentários. Abraço e obrigado ao Lauro pela gentileza.

magnet link
magnet link da canção 73


Olha aí:

“Melodia Sentimental” (Heitor Villa-Lobos/Dora Vasconcellos) – Zizi Possi
“Eu Sei Que Vou Te Amar” (Antonio Carlos Jobim/Vinicius Moraes) – Maysa
“Três Apitos” (Noel Rosa) – Aracy de Almeida
“Saudade da Bahia” (Dorival Caymmi) – Dorival Caymmi
“Domingo no Parque” (Gilberto Gil) – Gilberto Gil (original)
“Manhã de Carnaval” (Luiz Bonfá/Antônio Maria) – João Gilberto
“Tocando em Frente” (Renato Teixeira/Almir Sater) – Almir Sater ou Maria Bethânia
“Chula no Terreiro” (Elomar) – Elomar
“Valsa Brasileira (Edu Lobo/Chico Buarque) – Zizi Possi
“Que Maravilha” (Jorge Ben/Toquinho) – Jorge Ben e Toquinho
“Assum Preto” (Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira) – Gal Costa
“A Triste Partida” (Patativa do Assaré) – Luiz Gonzaga
“A Palo Seco” (Belchior) – Belchior
“Sem Destino” (Luiz Tatit) – Luiz Tatit
“Porto Alegre” (Péricles Cavalcanti) – Adriana Calcanhotto
“Terral” (Ednardo) – Pessoal do Ceará
“Asa Partida” (Fagner/Abel Silva) – Fagner
“Namorinho de Portão” (Tom Zé) – Gal Costa
“Três da Madrugada” (Torquato Neto/Carlos Pinto) – Gal Costa
“San Vicente” (Milton Nascimento/Fernando Brant) – Milton Nascimento
“Meu Silêncio” (Luiz Fernando Gonçalves/Cláudio Nucci) – Nana Caymmi
“Resposta ao Tempo” (Cristóvão Bastos/Aldir Blanc) – Nana Caymmi
“De Amor Eu Morrerei” (Dominguinhos/Anastácia) – Gal Costa
“Preciso Me Encontrar” (Candeia) – Cartola
“Acontece” (Cartola) – Cartola
“Canto do Povo de Um Lugar” (Caetano Veloso) – Caetano Veloso
“Modinha” (Rita Lee) – Ná Ozzetti
“Flor da Noite” (Celso Fonseca/Ronaldo Bastos) – Nana Caymmi
“Saga da Amazônia” (Vital Farias) – Vital Farias (original)
“Loucos de Cara” (Vitor Ramil) – Vitor Ramil (songbook “Foi no Mês Que Vem”)
“Azul da Cor do Mar” (Tim Maia) – Tim Maia
“Guia” (Pierre Aderne/Márcio Faraco) – António Zambujo
“Salve Linda Canção Sem Esperança” (Luiz Melodia) – Luiz Melodia (original)
“Canto em Qualquer Canto” (Itamar Assumpção/Ná Ozzetti) – Ná Ozzetti
“Sinal Fechado” (Paulinho da Viola) – Paulinho da Viola (original)
“O Meu Sim” (Marina Lima/Antonio Cícero) – Marina Lima
“Onde Está Você?” (Oscar Castro-Neves/Luvercy Florini) – Alaíde Costa (original)
“Cadê Meu Carnaval” (Geraldo Azevedo) – Geraldo Azevedo
“Vapor Barato” (Jards Macalé/Waly Salomão) – Gal Costa
“É d’Oxum” (Gerônimo/Vevé Calazans) – Gerônimo ou Gal Costa
“Chuvas de Cajus” (Alceu Valença) – Alceu Valença
“Pressentimento” (Elton Medeiros/Hermínio Bello de Carvalho) – Elton Medeiros
“Debaixo d’Água” (Arnaldo Antunes) – Maria Bethânia
“Coisa da Antiga” (Wilson Moreira/Nei Lopes) – Clara Nunes
“Duas Contas” (Garoto) – Wilson Simonal
“Estrela Miúda” (João do Vale) – Maria Bethânia ou Elba Ramalho
“Londrina” (Arrigo Barnabé) – Carlos Careqa
“Alegria” (Assis Valente) – Orlando Silva
“Nós” (Tião Carvalho) – Ná Ozzetti ou Cássia Eller
“Mangue e Fogo” (Rodrigo Campos) – Rodrigo Campos e Luísa Maita
“Meu Drama” (Silas de Oliveira/Joaquim Ilarindo) – Fabiana Cozza
“Sonhei Que Estava em Portugal” (Moraes Moreira) – Maria Bethânia
“Lágrimas Negras” (Jorge Mautner/Nelson Jacobina) – Gal Costa ou Caetano Veloso
“Poema” (Frejat/Cazuza) – Ney Matogrosso (original)
“Resposta” (Maysa) – Maysa
“Capoeira do Arnaldo” (Paulo Vanzolini) – Luiz Carlos Paraná
“Essa Mulher” (Joyce/Ana Terra) – Elis Regina
“Até Eu” (Baden Powell/Paulo César Pinheiro) – Baden Powell (original)
“Folia no Matagal” (Eduardo Dusek/Luiz Carlos Góes) – Eduardo Dusek ou Ney Matogrosso
“Isso é para a Dor” (Ângela Ro Ro) – Ângela Ro Ro
“Terra e Lua” (Luli e Lucina) – Luli e Lucina
“Me Faça Um Favor” (Luiz Carlos Sá/Gutemberg Guarabyra) – Sá, Rodrix & Guarabyra
“Reunião de Tristeza” (Sivuca) – Sivuca e Rosinha de Valença
“Sangue Latino” (João Ricardo/Paulo Mendonça) – Secos & Molhados
“Simplesmente” (Paulinho Nogueira) – Paulinho Nogueira
“Sua Estupidez” (Roberto Carlos/Erasmo Carlos) – Gal Costa ou Ná Ozzetti
“Cadeira Vazia” (Lupicínio Rodrigues) – Elis Regina
“Pra Machucar Meu Coração” (Ary Barroso) – Márcia
“Nada Além” (Custódio Mesquita/Mario Lago) – Orlando Silva
“Antonico” (Ismael Silva) – Gal Costa
“Sonora Garoa” (Passoca) – Eliete Negreiros
“Ilusão à Toa” (Johnny Alf) – Johnny Alf
“Noite Sem Luar” (Godofredo Guedes) – Eugénia Melo e Castro
“Yayá Massemba” (Roberto Mendes/Capinam) – Roberto Mendes ou Maria Bethânia
“Esta Melodia” (Bubu da Portela e Jamelão) – Marisa Monte e Velha Guarda da Portela
“Acreditar” (Dona Ivone Lara/Délcio Carvalho) – Dona Ivone Lara
“Faltando Um Pedaço” (Djavan) – Gal Costa
“Coração Ateu” (Sueli Costa) – Maria Bethânia
“O Último Pôr do Sol” (Lenine/Lula Queiroga) – Lenine e Marcos Suzano
“Castigo” (Dolores Duran) – Lúcio Alves
“Iracema” (Adoniran Barbosa) – Clara Nunes
“Pensar em Você” (Chico César) – Rita Ribeiro
“Pernambucobucolismo” (Marisa Monte/Rodrigo Campelo) – Marisa Monte
“Disparada” (Geraldo Vandré/Theo de Barros) – Jair Rodrigues
“Coco Verde” (Teca Calazans/Ricardo Vilas) – Teca Calazans
“Fazenda” (Nelson Ângelo) – Milton Nascimento
“Pelo Vinho e Pelo Pão” (Zé Ramalho) – Amelinha
“Mais Clara, Mais Crua” (“Palhaço”) (Egberto Gismonti/Geraldo Carneiro) – Olivia Byington
“Razão de Viver” (Eumir Deodato/Paulo Sérgio Valle) – Elizeth Cardoso
“Chuvas de Verão” (Fernando Lobo) – Caetano Veloso
“Chove lá Fora” (Tito Madi) – Tito Madi
“Toalha da Saudade” (Batatinha/J. Luna) – Batatinha ou Caetano Veloso
“A Flor e o Espinho” (Nelson Cavaquinho/Guilherme de Brito/Alcides Caminha) – Nora Ney
“Que Loucura” (Sérgio Sampaio) – Luiz Melodia
“Me Deixa em Paz” (Monsueto/Aírton Amorim) – Milton Nascimento e Alaíde Costa
“Cocada” (Antônio Vieira) – Rita Ribeiro
“Quem Me Quiser” (Antônio Adolfo/Jésus Rocha) – Ângela Ro Ro
“Pois é, pra Quê? (Sidney Miller) – MPB-4
“Enquanto a Tristeza Não Vem” (Sérgio Ricardo) – Sérgio Ricardo
“Flor de Ir Embora” (Fátima Guedes) – Fátima Guedes

Para Pepe Mujica



América do Sul
(Paulo Machado)

Deus salve a América do Sul
Desperta, ó claro e amado sol

Deixa correr
Qualquer rio que alegre esse sertão
Essa terra morena, esse calor
Esse campo, essa força tropical

Desperta América do Sul
Deus salve essa América Central

Deixa viver esses campos molhados de suor
Esse orgulho latino em cada olhar
Esse canto e essa aurora tropical

Deus salve a América do Sul
Desperta, ó claro e amado sol

Deixa correr
Qualquer rio que alegre esse sertão
Essa terra morena, esse calor
Esse campo, essa força tropical

Desperta América do Sul
Deus salve essa América Central

Deixa viver esses campos molhados de suor
Esse orgulho latino em cada olhar
Esse canto e essa aurora tropical

Personalidade - Diumtudo 2013


José Alberto Mujica Cordano, conhecido popularmente como Pepe Mujica - presidente da República Oriental do Uruguai.

OS MELHORES DE 2013

Por Felipe Araújo

Hora de passar 2013 a limpo. Ao longo do ano, alguns encontros boêmios em Fortaleza – em botecos ou restaurantes - cativaram este hebdomadário balcão. Seja pela qualidade da cerveja, seja pela qualidade da música (e também da comida, do ambiente, dos interlocutores, entre outros critérios pessoais e intransferíveis). Para a coluna, os prazeres de uma boa mesa e de um bom papo de botequim são imensuráveis e, portanto, sempre imprecisos. No inefável da boemia, já dizia o poeta, a alegria é a prova dos nove. Vejamos então o que de melhor tivemos no ano.

1.Clube dos Gatos / Cantinho do Frango (Aldeota)

Ao longo de 2013, o Cantinho do Frango (Torres Câmara, 71) promoveu três projetos extremamente preciosos aos olhos (e ouvidos) deste colunista. O primeiro, os encontros dominicais reunindo a fina flor da música cearense. O segundo, o happy hour musicado pelos vinis do DJ Alan Morais. E o terceiro, as serestas quinzenais das quintas-feiras capitaneadas pelo Clube dos Gatos e pelo violão insuperável de Zivaldo Maia. Nessas noitadas, Fausto Nilo, Luizinho Calixto, Tarcísio Sardinha e Nonato Luis, entre outros, já deram canjas memoráveis.

2. Corredor etílico-cultural do Benfica (Benfica)

Falar da relação do Benfica com a boemia é chover no molhado. Mas apesar da escalada da violência e das grosserias do poder público (que recentemente amputou mais algumas árvores – e sombras - na rua Padre Francisco Pinto), ir aos bares do Benfica é sempre um reencontro com uma outra possibilidade de cidade, mais leve, mais fraterna e mais musical – vide as violas do Buraco da Lúcia, os sambas do Chaguinha, os ensaios dos blocos Sanatório Geral e Luxo da Aldeia, etc.

3. Raimundo dos Queijos(Centro)

Um fenômeno das manhãs de domingo. Música ao vivo, comida regional e personagens típicos da molecagem cearense. Quem ainda pensa que o Centro precisa ser “revitalizado” precisa urgentemente conhecer o Raimundo dos Queijos (Travessa Crato s/n) para perceber que aquela área está mais viva que nunca. Falta-lhe apenas carinho e cuidado efetivo da parte do poder público.

4. Tardes de sábado no Alpendre (Aldeota)

Uma das melhores cozinhas regionais de Fortaleza (vide o carneiro guisado e a carne de sol ao leite) e uma cerveja extremamente digna. Aos sábados, mesmo sem música, o clima de gozação entre as mesas do Alpendre (Torres Câmara, 172) torna a tarde leve e fraterna por conta da espirituosidade dos convivas.

5. Bodega do Seu Roberto (Monte Castelo)

No bairro do Monte Castelo (R. José Cândido, 299, esquina com Henrique Autran), uma tradicionalíssima esquina boêmia que desde os anos 1960 reúne uma clientela fiel em torno de muita cerveja gelada, petiscos generosos e boa música. Nas manhãs de domingo, por exemplo, há uma roda de samba e choro que reúne alguns bambas da Cidade. (http://bit.ly/1c7G8Dj)

http://www.opovo.com.br/app/colunas/papodebotequim/2013/12/20/notpapodobotequim,3177751/encontros-boemios.shtml

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Nu, de botas - Antonio Prata

Por Marcus Vinicius

Recomendação - pra quem tem de 25 a 40 anos ou é pai ou mãe de "jovens" de 25 a 40 anos. Um bom livro de Antonio Prata.


Eu pensei que todo mundo fosse filho de papai noel....

Por Marcus Vinicius

Assis Valente e suas Boas Festas.

Minha Embaixada Chegou

por Marcus Vinicius

Nestes tempos de pré-pré-carnaval nada melhor que o transgressor Assis Valente.

 "Meu povo pede licença/pra na batucada desacatar." 

"Minha embaixada chegou/Meu povo deixou passar/Ela agradece a licença/Que o povo lhe deu para desacatar." 


Minha embaixada chegou (Assis Valente)

Minha embaixada chegou,
Deixa o meu povo passar,
Meu povo pede licença,
Pra na batucada desacatar.

Vem vadiar no meu cordão,
Cai na folia meu amor,
Vem esquecer tua tristeza,
Mentindo a natureza,
Sorrindo a tua dor.

Eu vi o nome da favela,
Na luxuosa academia,
Mas a favela pro doutô,
É morada de malandro,
que não tem nenhum valor.

Não tem doutores na favela,
Mas na favela tem doutores,
O professor se chama bamba,
Medicina é na macumba,
Cirurgia, lá é samba.

Minha embaixada chegou...
Vem vadiar no meu cordão...

Já não se ouve a batucada,
A serenata, não há mais,
E o violão deixou o morro,
E ficou pela cidade,
Onde o samba não se faz.

Minha embaixada chegou
Meu povo deixou passar
Ela agradece a licença
Que o povo lhe deu para desacatar.


quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Eu sou de farrear em fandangos, brincar em cordões, louvar os reis do Oriente e gostar das moças do Cordão Encarnado.

por Luiz Antonio Simas
via Bruno Perdigão

O grupo Roupa Nova gravou, em 2007, um CD com músicas natalinas, chamado "Natal todo dia". O repertório é um horror, estruturado, sobretudo, em versões para o português de músicas norte-americanas. O argumento utilizado para esse predomínio de canções estrangeiras é a ausência de uma tradição de músicas natalinas brasileiras. O produtor Max Pierre declarou ao jornal O Globo, à época do lançamento, o seguinte: "Na semana passada fui a Gramado e fiquei ouvindo aquelas músicas em inglês, lamentando não termos canções em português para sonorizar a festa". A cantora Simone, que gravou um repertório parecido num disco de 1995, também afirma que a ausência de canções brasileiras de Natal a levou a privilegiar canções norte-americanas e inglesas. Para este Natal de 2013, artistas sertanejos, pagodeiros, cantoras baianas e o conjunto da Galinha Pintadinha gravaram o cd e DVD “Natal em Família”.

É assustador.

A ladainha é a mesma. No meio de uma ou outra canção brasileira, sobram versões de canções em inglês. Quero apenas dizer que esse argumento do Roupa Nova, da Simone e do produtor é conversa pra boi dormir. O Brasil tem forte tradição de músicas natalinas. 

Basta lembrar dos pastoris, cheganças, marujadas, bois-de-calemba, fandangos, lapinhas, congadas e folias de Santos Reis. Ou será que esses caras (trabalham com cultura) não sabem que todas as manifestações culturais que citei - existem outras - fazem parte do ciclo natalino? Os que dizem isso, enfim, ou são ignorantes ou fazem o jogo dos que apostam na uniformização de padrões culturais, conhecimentos e técnicas. Querem que fiquemos ouvindo aqueles troços tristes, desagradáveis, uns "White Christmas" deprimentes que funcionam melhor como trilha sonora de suicídio. 

Eu sou de farrear em fandangos, brincar em cordões, louvar os reis do Oriente e gostar das moças do Cordão Encarnado. Que fique registrada, pois, a minha bronca.

Camisa do LUXO DA ALDEIA 2014

Arte de Ramon Cavalcante - http://www.ramoncavalcante.com


terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Banco Mundial e SUS: o que você só vê na mídia

Eduardo Fagnani

A manchete da primeira página da Folha (9/12/13) não deixa margem à dúvida: “Ineficiência marca gestão do SUS, diz Banco Mundial”. A matéria destaca que essa é “uma das conclusões de relatório inédito obtido com exclusividade pela Folha”. Aos desavisados a mensagem subliminar é clara: o SUS é um fracasso e o Ministro da Saúde, incompetente.

A curta matéria da suposta avaliação do Banco Mundial sobre vinte anos do SUS é atravessada de “informações” sobre desorganização crônica, financiamento insuficiente, deficiências estruturais, falta de racionalidade do gasto, baixa eficiência da rede hospitalar, subutilização de leitos e salas cirúrgicas, taxa média de ocupação reduzida, superlotação de hospitais de referência, internações que poderiam ser feitas em ambulatórios, falta de investimentos em capacitação, criação de protocolos e regulação de demanda, entre outras.

Desconfiado, entrei no site do Banco Mundial e consegui acesso ao “inédito” documento “exclusivo”**. Para meu espanto, consultando as conclusões da síntese (Overview), deparei-me com a seguinte passagem que sintetiza as conclusões do documento (página 10):

“Nos últimos 20 anos, o Brasil tem obtido melhorias impressionantes nas condições de saúde, com reduções dramáticas mortalidade infantil e o aumento na expectativa de vida. Igualmente importante, as disparidades geográficas e socioeconômicas tornaram-se muito menos pronunciadas. Existem boas razões para se acreditar que o SUS teve importante papel nessas mudanças. A rápida expansão da atenção básica contribuíu para a mudança nos padrões de utilização dos serviços de saúde com uma participação crescente de atendimentos que ocorrem nos centros de saúde e em outras instalações de cuidados primários. Houve também um crescimento global na utilização de serviços de saúde e uma redução na proporção de famílias que tinham problemas de acesso aos cuidados de saúde por razões financeiras. Em suma, as reformas do SUS têm alcançado pelo menos parcialmente as metas de acesso universal e equitativo aos cuidados de saúde (tradução rápida do autor)."


Após ler essa passagem tive dúvidas se havia lido o mesmo documento obtido pela jornalista. Fiz novos testes e cheguei à conclusão que sim. Constatado que estava no rumo certo continuei a ler a avaliação do Banco Mundial e percebí que as críticas são apontadas como “desafios a serem enfrentados no futuro”, visando o aperfeiçoamento do SUS.

Nesse caso, o órgão privilegia cinco pontos, a saber: ampliar o acesso aos cuidados de saúde; melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços de saúde; redefinir os papéis e relações entre os diferentes níveis de governo; elevar o nível e a eficácia dos gastos do governo; e, melhorar os mecanismos de informações e monitoramento para o “apoio contínuo da reforma do sistema de saúde” brasileiro.

O Banco Mundial tem razão sobre os desafios futuros, mas acrescenta pouco ao que os especialistas brasileiros têm dito nas últimas décadas. Não obstante, é paradoxal que esses pontos críticos ainda são, de fato, críticos, em grande medida, pela ferrenha oposição que o Banco Mundial sempre fez ao SUS, desde a sua criação em 1988: o sistema universal brasileiro estava na contramão do “Consenso de Washington” e do modelo dos “três pilares” recomendado pelo órgão aos países subdesenvolvidos.*** É preciso advertir aos leitores jovens que, desde o final dos anos de 1980, Banco Mundial sempre foi prejudicial à saúde brasileira.

É uma pena que o debate sobre temas nacionais relevantes – como o sistema público de saúde, por exemplo – seja interditado pela desinformação movida pelo antagonismo das posições políticas, muitas vezes travestido de ódio, que perpassa a sociedade, incluindo a mídia.

Que o espírito reconciliador Mandela ilumine os brasileiros – e o pobre debate nacional.

*Professor do Instituto de Economia da Unicamp, pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho (CESIT/IE-UNICAMP) e coordenador da rede Plataforma Política Social – Agenda para o Desenvolvimento (www.politicasocial.net.br).

**Twenty Years of Health System Reform in Brazil - An Assessment of the Sistema Único de Saúde. Michele Gragnolati, Magnus Lindelow, and Bernard Couttolenc. Human Development. 2013 International Bank for Reconstruction and Development / The World Bank 1818 H Street NW, Washington DC.

***Consultar, especialmente: BANCO MUNDIAL (1990). World Development Report: Poverty. Washington, D.C; BANCO MUNDIAL (1991). Brasil: novo desafio à saúde do adulto. Washington, D.C. 1991; BANCO MUNDIAL (1993). World Development Report: Investing in Health. Washington, D.C; BANCO MUNDIAL (1994). Envejecimiento sin crisis: Políticas para la protección de los ancianos y la promoción del crecimiento. Washington, D.C; e BANCO MUNDIAL (1995). A Organização, Prestação e Financiamento da Saúde no Brasil: uma agenda para os anos 90. Washington, D.C.
ARQUIVO
banco_mundial-20_anos_da_reforma_do_sistema_de_saude_no_brasil.pdf

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Anticomputador Sentimental


Mambembe - Rua dos Tabajaras, 368 - Praia de Iracema
Fortaleza-Ce

Dona Cila do Côco




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DONA CILA DO COCO
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a film by Vincent Moon
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recorded in SESC Pompeia, São Paulo, february 2013
images & edit by Vincent Moon
sounds by Fernanda Frazão, Carol Kanashiro, Adriano Singolani, Bruno Bachy
mix by Borja Flames
produced by Vincent Moon & SESC Pompeia
with the help of Joa Azria
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Teresa Cristina

Aos portelenses daqui de Fortaleza.

◊ Sons do Brasil 2013 ◊ TERESA CRISTINA ◊ from Vincent Moon / Petites Planètes on Vimeo.

TERESA CRISTINA
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a film by Vincent Moon
with the participation of PAULÃO 7 CORDAS and TIA SURICA
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recorded in Madureira, Rio de Janeiro zona norte, february 2013
images, sounds & edit by Vincent Moon
produced by Vincent Moon & Teresa Cristina
with the help of Diogo Pires Gonçalves & Raphael Santanna

Metá Metá

◊ Sons do Brasil 2013 ◊ METÁ METÁ ◊ from Vincent Moon / Petites Planètes on Vimeo.

METÁ METÁ
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a film by Vincent Moon
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Kiko Dinucci
Juçara Marçal
Thiago França
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recorded in São Paulo, february 2013
images & edit by Vincent Moon
sounds by Edson Kumasaka & Joa Azria
produced by Vincent Moon & Metá Metá
with the help of Joa Azria & Edson Kumasaka

domingo, 15 de dezembro de 2013

Michelle Bachelet é eleita novamente presidente do Chile

Por Terra

A socialista Michelle Bachelet foi eleita novamente presidente do Chile, para o período 2014-2018, após vencer neste domingo, no segundo turno das eleições nacionais, com 62,59% sobre 37,4% da candidata da direita, Evelyn Matthei - com 56% das mesas apuradas, que mostravam uma tendência irreversível, informou o Serviço Eleitoral do país. Bachelet, uma pediatra de 62 anos que se transformou na primeira mulher chilena a alcançar a presidência, em 2006, se tornou a primeira presidente reeleita depois de mais de 60 anos.


Os locais de votação do Chile começaram a fechar às 18h (19h de Brasília), num dia marcado por pouca afluência de eleitores, nas eleições para definir a nova presidente do país, entre a socialista Michelle Bachelet, e a candidata de direita, Evelyn Matthei. Após 10 horas de votação, as mais de 41 mil mesas habilitadas em 2,1 mil colégios eleitorais em todo o Chile davam lugar à contagem de votos.

A adversária Evelyn Matthei já reconheceu a derrota. Bachelet esperava os resultados da eleição junto com sua equipe de campanha no comitê montado num hotel da emblemática avenida Alameda, no centro de Santiago. Nas proximidades do comitê foi montado, há algumas horas, um cenário para a previsível vitória.

O dia foi marcado por uma baixa participação de eleitores, de acordo com as expectativas dos analistas, ante a um previsível triunfo de Bachelet, que no primeiro turno venceu com 46,6% dos votos contra Matthei, que obteve 25,1%. Muitos dos eleitores decidiram não votar e fazer suas compras, a 10 dias do Natal, segundo constatou a AFP. Espera-se que, neste domingo, menos de 6,6 milhões de eleitores tenham votado, dos 13 milhões, que foram às urnas no primeiro turno.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

NOTA SOBRE A PARTICIPAÇÃO DO BLOCO LUXO DA ALDEIA NO FESTIVAL NOITES BRASILEIRAS

Nós, do Bloco Luxo da Aldeia, gostaríamos de pedir desculpas pela curta duração da nossa apresentação nesta Quinta-feira, 12/12/13, no festival Noites Brasileiras. Ela estava prevista para iniciar à meia-noite, com duração de 01 hora. No entanto, além de começar com 01 hora e 30 minutos de atraso, foi interrompida diversas vezes até ser cortada com 45 minutos de duração. Nós fomos avisados pela produção do evento, apenas aos 25 minutos de show, que faltavam 10 minutos para terminar, o que nos causou chateação, indignação e nos levou a não fazer intervalos entre as músicas finais, esticando um pouco mais o tempo que nos restava.

A produção do festival alegou que o evento, por ser realizado em espaço público, deveria possuir uma licença do poder público com horário de término programado e que este já havia sido extrapolado, correndo o risco de ser embargado. Compreendemos tais condições e riscos, pois organizamos uma festa na rua, pública, gratuita e sem fins lucrativos há sete anos. No entanto, por respeito aos músicos e ao público que se deslocou de casa para ver as diversas atrações da noite, fazia-se necessário ter clareza e transparência em relação aos atrasos ocorridos, e de que forma isso afetaria a programação geral do evento.

Em nenhum momento, antes do show, fomos avisados que nossa apresentação seria mais curta do que a combinada. Isso, reiteramos, só aconteceu quando já tocávamos, o que nos deixou profundamente chateados com a falta de profissionalismo da produção. Nossa principal motivação, ao fazer shows e o carnaval de rua, são os foliões. Acreditamos e sentimos que cada um que está curtindo conosco também é uma parte importante do bloco, não só um mero espectador. Se divulgamos e contribuímos de alguma forma o evento para que ele fosse um sucesso, é porque acreditávamos nele. Infelizmente, não saiu como esperávamos e desejamos que os outros artistas que se apresentarão nesta sexta e neste sábado, Pinduca, Gang do Eletro, Karina Buhr, Silvério Pessoa e outros mais, e seus respectivos públicos, não passem pelo constrangimento que passamos.

Agradecemos de coração a todos vocês que curtiram, cantaram, pularam e se esbaldaram até às 02:30 da madrugada de uma quinta pra sexta, na Praia de Iracema. Conseguir isso nos dias de hoje, em Fortaleza, é uma vitória muito grande. Agradecemos, de forma especial, ao nosso amigo Jolson Ximenes, grande músico da banda Os Transacionais, pela participação na banda do bloco ontem à noite e pela força que nos deu.

Infelizmente, encerramos as nossas apresentações de 2013 de uma forma que não queríamos. Mas 2014 já bate à porta e vem muita coisa boa por aí. E, como aprendemos com Fausto Nilo, “vamos pra frente que pra trás não dá mais”.

Simbora, Luxo da Aldeia!


PS: A foto que acompanha a nota estava disponível na Fanpage do próprio evento. Carnaval cearense, quando o povo quer, é feito em qualquer lugar, qualquer dia e a qualquer hora.

"Em mim, a despeito de um dia difícil..."

Por Dora Moreira

Quando criança, morava numa casa no Meireles e durante três dias, perto do carnaval, ia com as meninas que trabalhavam lá em casa sentar no descampado e assistir passar os trio-elétricos do Netinho, do Aza, da Ivete, já que dormir não era uma opção (e ouvir Maria Joaquina de Amaral Pereira Góes era massa). Já adulta (veish), li dia desses uma passagem falando como o carnaval anda "distante da potência de uma festa de reinvenções do mundo pela subversão da vida" (Esqueci título e autor, guardei as aspas). Hoje, me dei conta de que nunca agradeci por uma das coisas mais fantásticas que me aconteceu enquanto fortalezense.

Há uns quase oito anos, um primo e uns futuros amigos (que me apresentariam a Ladeira da Tia em Olinda) botaram na rua uma angústia em forma de idéia: em uma Fortaleza marcada por (sabe-se lá quantos) cordões de isolamentos, iam fazer um bloco de (pré) carnaval de rua. Mas iam fazer um bloco que nem saia do canto, nem contava com um garboso naipe de metais. E como para bom carnavalesco toda reinvenção é pouca, iam fazer um bloco só com canções, entre famosas e esquecidas, de compositores cearenses.

Sem pretensão de promover um grande 'resgate cultural' ou uma grande 'valorização da cultura popular cearense' e apostando, por outro lado, na recriação em arranjos e formatos, o bloco fez sua tradição e hoje, às 2h da manhã de uma quinta-feira de dezembro todo mundo, entre sóbrios e ébrios, despencou no calçadão de Iracema. Em mim, a despeito de um dia difícil, de coração triste e olhos rasos d'água, o corpo explodia de alegria e decretava: no carnaval de 2014, eu fico.

E é aos meninos do Bloco Luxo da Aldeia que eu agradeço não só pelos incontáveis carnavais do Benfica, mas principalmente por duas certezas que carrego no corpo: Fortaleza é massa e 'é no meio da rua que a gente começa'.

(E parece que, pra nossa sorte, dentro desses meninos passa uma rua onde é carnaval o ano todo.)

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Na fita cassete - Áurea Martins

por Marcus Vinicius

para Bruno Perdigão, Mateus Perdigão, Norma Perdigão e Roberto B. Leite.



                             

O Fracasso Socialista de Mandela

por Slavoj Zizek, em The Stone

Nas duas últimas décadas de sua vida, Nelson Mandela foi celebrado como modelo de como a libertação de um país de seu colonizador pode ser feita sem que se caia na tentação do poder ditatorial e na pose anticapitalista.
Em resumo, Mandela não era Mugabe, a África do Sul continuou sendo uma democracia pluripartidária com imprensa livre e economia vibrante bem integrada ao mercado global e imune às ligeiras experiências socialistas.
Agora, com sua morte, sua estatura como homem santo e sábio parece confirmada para a eternidade: existem filmes de Hollywood sobre ele – ele foi interpretado por Morgan Freeman que, por sinal, também fez o papel de Deus em outro filme; astros do rock e líderes religiosos, atletas e políticos, de Bill Clinton a Fidel Castro, estão todos unidos em sua beatificação.
É muito simplista criticar Mandela por ter abandonado a perspectiva socialista depois do fim do apartheid: mas ele realmente tinha escolha?
E essa é toda a história? Dois fatos-chave continuam escondidos por esta visão celebratória.
Na África do Sul, a vida miserável da maioria pobre em geral continua a mesma de antes do apartheid, e o crescimento dos direitos civis e políticos é contrabalançado pelo aumento da insegurança, da violência e do crime.
A grande mudança é que à antiga classe branca dominante se somou a nova elite negra.
Em segundo lugar, as pessoas se lembram do antigo Congresso Nacional Africano que prometeu não apenas acabar com o apartheid, mas também justiça social e até mesmo uma espécie de socialismo.
Esse passado bem mais radical do CNA é gradualmente obliterado da nossa memória. Não é de espantar que o ódio entre os pobres e negros sul africanos esteja aumentando.
Neste ponto, a África do Sul é apenas uma versão da história contemporânea e recorrente da esquerda.
Um líder do partido é eleito com entusiasmo universal, prometendo um “novo mundo” – porém, mais cedo ou mais tarde, ele tropeça no dilema chave: ousa tocar nos mecanismos capitalistas ou decide “jogar o jogo”?
Se ele escolhe perturbar esses mecanismos, ele é rapidamente “punido” por distúrbios no mercado, caos econômico e todo o resto.
É por isso que seria muito simples criticar Mandela por ter abandonado a perspectiva socialista depois do fim do apartheid: ele realmente tinha escolha? A mudança em direção ao socialismo era uma opção real?
É fácil ridicularizar Ayn Rand, mas existe uma pitada de verdade no famoso “hino ao dinheiro” de seu romance “Atlas Shrugged”: “Até que e a não ser que você descubra que o dinheiro é a raiz de tudo que há de bom, você está pedindo sua própria destruição. Quando o dinheiro deixa de ser o meio pelo qual os homens lidam uns com os outros, então os homens se tornam as ferramentas uns dos outros. Sangue, chicotes e armas ou dólares. Faça sua escolha – não existe outra”.
Marx não disse algo similar em sua bem conhecida fórmula sobre como, no universo das commodities, “as relações entre as pessoas assumem a aparência das relações entre as coisas”?
Na economia de mercado, as relações entre as pessoas podem parecer relações baseadas na igualdade e na liberdade: a dominação não é mais direta e visível como tal.
O que é problemático na premissa subjacente de Rand: que a única escolha é entre relações diretas ou indiretas de dominação e exploração — qualquer alternativa é descartada como utópica.
Entretanto, devemos ter em mente o momento da verdade na alegação ideologicamente ridícula de Rand: a grande lição do socialismo de Estado foi efetivamente a abolição direta da propriedade privada e das trocas reguladas pelo mercado; não ter formas concretas de regulação social do processo de produção necessariamente ressuscita relações diretas de servidão e dominação.
Se meramente abolimos o mercado (inclusive a exploração de mercado) sem substituí-lo por uma forma apropriada de organização comunista da produção e das trocas, a dominação volta com sede de vingança e com sua exploração direta.
A regra geral é que, quando uma revolta contra um regime semidemocrático começa, como foi o caso do Oriente Médio em 2011, é muito fácil mobilizar as massas com slogans que não se caracterizam de outra forma a não ser como agradáveis ao povo  – em defesa da democracia, contra a corrupção, por exemplo.
Mas então, aos poucos, chegamos a escolhas mais difíceis: quando nossa revolta é vitoriosa em seu objetivo principal, nos damos conta de que o que realmente nos incomodava (nossa falta de liberdade, a humilhação, corrupção social, falta de perspectiva de uma vida decente) continua sob novo disfarce.
A ideologia dominante mobiliza então todo seu arsenal para evitar que cheguemos a essa conclusão.
Começa a nos dizer que a liberdade democrática traz com ela reponsabilidade, que vem com um preço, que ainda não amadurecemos se esperamos demais da democracia.
Dessa forma, nos culpa por nossos fracassos: em uma sociedade livre, nos dizem, somos todos capitalistas investindo em nossas vidas, devemos investir mais na nossa educação do que em nos divertir se quisermos ser bem sucedidos.
Em um nível político mais direto, a política externa dos Estados Unidos elaborou uma estratégia detalhada para exercer o controle desse problema de forma que recanaliza as revoltas populares para constrangimentos parlamentares-capitalistas aceitáveis – como foi feito com sucesso na África do Sul depois da queda do regime do apartheid, nas Filipinas depois da queda de Marcos, na Indonésia depois da queda de Suharto, e em outros lugares.
Nessa conjuntura precisa, políticas emancipatórias radicais encaram um grande desafio: como levar as coisas adiante depois que o primeiro estágio de entusiasmo passa, como dar o próximo passo sem sucumbir à catástrofe da tentação “totalitária” – em resumo, como ir além de Mandela sem se tornar Mugabe.
Se queremos nos manter fiéis ao legado de Mandela, devemos nos esquecer das lágrimas de crocodilo celebratórias e focar nas promessas não cumpridas que sua liderança fez nascer.
Podemos seguramente supor que, levando em conta sua grandeza moral e política inquestionável, ele chegou ao fim da vida um homem idoso e amargo, consciente de que seu triunfo político e sua elevação à categoria universal de herói era uma máscara da derrota amarga.
A glória universal de Mandela também é um sinal de que ele realmente não perturbou a ordem e o poder globais.
Slavoj Zizek é um filósofo esloveno, psiquiatra e teórico social da Escola de Direito de Bikbeck, Universidade de Londres. Ele é autor de vários livros, entre eles “Less Than Nothing, “The Year of Dreaming Dangerously” e “Demanding the Impossible.”
PS do Viomundo: Alguns jornalistas descerebrados, que se encantam com a oratória de Obama, se esquecem do essencial. Os Estados Unidos deram décadas e décadas de sustentação ao regime do apartheid, aberta ou clandestinamente. Enquanto isso, milhares de cubanos morreram na luta contra os racistas africanos. Ao defender o regime do MPLA em Angola, deram uma sova militar tão grande no regime do apartheid que contribuiram para seu enfraquecimento e isolamento. Quem estava do lado certo da História: os antecessores de Obama ou Fidel Castro?                                   

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Obama e Raúl Castro trocam aperto de mãos no funeral de Mandela

Por Stella Mapenzauswa e David Dolan
JOHANESBURGO, 10 Dez (Reuters) - Os presidentes dos Estados Unidos, Barack Obama, e de Cuba, Raúl Castro, trocaram um aperto de mãos nesta terça-feira durante a cerimônia póstuma em homenagem ao líder sul-africano Nelson Mandela, deixando de lado por alguns instantes um conflito que dura mais de meio século.
Seguindo o legado de conciliação deixado por Mandela, Raúl sorriu ao receber o cumprimento de Obama a caminho do palanque, onde o presidente norte-americano fez um inflamado discurso homenageando o primeiro presidente negro da África do Sul, que morreu na quinta-feira, aos 95 anos.
Dançando e cantando, dezenas de milhares de pessoas suportaram uma chuva torrencial de várias horas no estádio Soccer City, em Johanesburgo, enquanto cerca de 90 dignitários mundiais lotavam o palanque.
A multidão vibrou quando Obama assumiu seu assento, num forte contraste com a vaia destinada ao presidente sul-africano, Jacob Zuma, um líder marcado por escândalos, cuja fraqueza ficou ainda mais visível nesta semana de comparações com Mandela.
O polêmico líder do vizinho Zimbábue, Robert Mugabe, também foi muito aplaudido.
A presidente Dilma Rousseff, um dos seis chefes de Estado escolhidos para discursar na cerimônia, disse que a luta de Mandela pela liberdade e justiça transcendeu as fronteiras da África do Sul e inspirou a luta no Brasil e na América do Sul.
Em sua fala, Obama recriminou líderes que se apressaram em demonstrar solidariedade com a luta de Mandela contra a opressão e a injustiça, ao mesmo tempo em que não permitiam liberdades nos seus próprios países.
"Há muitos de nós que abraçamos alegremente o legado de reconciliação racial deixado por Madiba (nome de Mandela por seu clã), mas resistem apaixonadamente até mesmo a reformas modestas que desafiassem a pobreza crônica e a crescente desigualdade", afirmou.
"Há muitos líderes mundiais que declaram solidariedade à luta de Madiba pela liberdade, mas não toleram a dissidência da seu próprio povo", acrescentou Obama, que, assim como Mandela, também é o primeiro negro a governar seu país.
As relações entre Cuba e os Estados Unidos estão congeladas desde logo depois da Revolução de 1959, liderada por Fidel Castro, irmão de Raúl. Há mais de meio século Washington mantém um bloqueio econômico ao regime comunista de Havana.
(Reportagem adicional de Steve Holland)

Um aperto de mão


segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Tem cearense no samba

Por Nelson Augusto

Os primeiros registros em disco de um compositor popular cearense, José Ramos Filho (1871-1916), não constavam explicitamente como sambas. Ramos Cotoco, como ficou conhecido artisticamente, morreu um ano antes do registro oficial do primeiro samba, “Pelo Telefone”, em 1917, embora o pesquisador cearense Nirez discorde do fato histórico e possua em seu acervo, registros que provam o contrário. Daí, na pequena, mas importante obra do compositor alencarino, recheada de cançonetas, chulas, lundus e valsas, algumas foram gravadas pelo cantor Baiano, um dos principais cantores da mais importante gravadora do Brasil no início do século XX, a Casa Edson.

Já em 1937, o compositor cearense Lauro Maia foi o ganhador do concurso musical no Rio de Janeiro, na categoria de sambas, do jornal carioca O Povo com sua criação “Eis Meu Samba”. Ainda morando em Fortaleza, Lauro Maia, que havia sido registrado em disco no Rio de Janeiro com outros estilos musicais pelo grupo cearense Quatro Azes e Um Coringa com “Eu Vi Um Leão” (1942), e “Fan Ran, Fun Fan” e “Trem de Ferro”, ambas no ano seguinte, teve seu samba “Febre de Amor” gravado por Orlando Silva, uma espécie de Roberto Carlos de sua época. O Cantor das Multidões emprestaria também sua potente voz para “Samba de Roça”, parceria de Lauro Maia com seu cunhado Humberto Teixeira, em 1945. Nesse ano, Lauro vai residir no Rio de Janeiro, e em 1946 já tem o samba “Deus Me Perdoe”, também dividido com Humberto Teixeira, cantado num 78 rpm por Ciro Monteiro.

Ainda na década de 40 os alencarinos Gilberto Milfont e os grupos Quatro Azes e Um Coringa e Vocalistas Tropicais seguiram a tradição cearense do samba na MPB gravaram vários clássicos do gênero. Dick Farney gravou em 1946 o samba “Esquece” do cantautor Gilberto Mifont. Esse registrou com sucesso no mesmo ano, os sambas “Aquela Mulher” e “Apelo”, ambas da conceituada dupla Pedro Caetano e Claudionor Cruz. Em 1950, Milfont cantou em disco o seu maior hit no samba, o carnavalesco “Prá Seu Governo”, de Haroldo Lôbo.

Outro grupo, o Trio Nagô, que destacou Evaldo Gouveia para a MPB, continuou a tarefa do samba pelos cearenses na década de 50. Entre outros, colocaram em discos, samba de nordestinos “Aquarela Cearense” (53) do conterrâneo Waldemar Ressurreição; e “Vive Seu Mané Chorando” (55) do maranhense Luiz Assunção. Ainda nos anos 60, Evaldo colaborou com o samba em “Garota Moderna” (65), no suíngue de Wilson Simonal; e “O Conde” (69), imortalizado por Jair Rodrigues. Na década seguinte, apesar de continuar suas parcerias românticas com o letrista capixaba Jair Amorim, o cearense de Iguatu também se aventurou numa nova seara: o samba-enredo. A dupla foi a grande vencedora em 1973 do concurso da agremiação carioca Portela com “O Mundo Melhor de Pixinguinha”. Na mesma escola de samba, repetiram a façanha em 1977 com “Mulher à Brasileira”.

Da geração do Pessoal do Ceará, citamos Ednardo, que gravou de sua autoria em 1978 “É Cara de Pau”. Fagner cantou em dueto com Zico em 1983 num compacto simples que também traz “Batuquê de praia”, o samba “Cantos do Rio”, de Petrúcio Maia. O cantor de Orós em seu LP de 1985 divide os vocais com a carioca Beth Carvalho em “Te Esperei”, de Gereba e Capinam. Amelinha, no álbum Caminhos do Sol, de 1985, interpreta “Samba Enredo Para um Grande Amor” de Luiz Carlos da Vila.

Uma coletânea lançada em vinil, no fim dos anos 80, reuniu alguns grupos de samba da Cidade. Nele, já se revelava com destaque o cantor e compositor Carlinhos Palhano. Além de Carlinhos, destacamos hoje David 7 Cordas, Ciribáh Soares, Academia, Policarpo e a Estrela de Madureira, Messias Castro, Leandro Rodrigues, Paulinho Brasil, Malena Monteiro, Gabriela Nunes, Marina Cavalcante, Samba de Rosas, Márcio Vianna, Vilmar Santos, Pasconith Franklin, Antonio Daniel, Damas Cortejam, Thais Costa Lima, Fernanda Farias, Michele Matheus, Lorena Lucena Tôrres e Danielly Ferreira, entre outros.

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2013/11/30/noticiasjornalvidaearte,3169829/tem-cearense-no-samba.shtml

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

A empresa da Globo no Panamá!

Por Miguel do Rosário

Já que a Globo, por causa do hotel onde Dirceu irá trabalhar, está tão interessada nas empresas do Panamá, seria bom aproveitar a viagem e explicar ao distinto público porque os irmãos Marinho figuraram como diretores de uma firma naquele país. Trata-se da Chibcha Investment Corporation, presidida por José Manuel Aleixo.




Os irmãos Marinho, todo mundo conhece. Vamos ver quem são os outros.

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Miguel Coelho Netto Pires Gonçalves é hoje diretor-executivo da Fides Ações. Iniciou sua carreira no mercado financeiro em 1979 como Diretor do Banco do Estado do Rio de Janeiro – Banerj. Possui vasta experiência na área de finanças corporativas, na qual atuou como Superintendente Executivo da área administrativo-financeira da TV Globo de 1980 a 1991, e, posteriormente, como Superintendente Executivo da Globopar, de 1991 a 1994. Foi sócio responsável pela idealização e criação do Banco ABC-Roma e participou do conselho de diversas empresas como: Editora Globo, NEC do Brasil, Seguradora Roma e Globo Agropecuária.

Esta parece ser a figura chave para se entender a razão de ser desta empresa panamanenha. Em julho deste ano, o blog do Mello, publicou um post no qual ele é citado.

"Nenhuma outra quadrilha lucrou tanto no negócio de assalto a banco como a quadrilha da Rede Globo’ – O Pasquim

A edição de 29 de setembro de 1983 do jornal carioca O Pasquim não fez por menos. Chamou o então presidente das Organizações Globo Roberto Marinho de “o maior assaltante de bancos do Brasil”.

“Nos dias 28 de fevereiro e 29 de maio de 1980, sem nenhum registro na crônica policial, foram praticados os dois maiores assaltos a banco da história do Brasil. Em duas operações distintas, o grupo do Sr. Roberto Marinho levantou no Banerj, a juros de dois por cento ao mês, a importância de 449 milhões e 500 mil cruzeiros [aproximadamente US$ 613 mil, BdoM]“.

Na reportagem, O Pasquim demonstrou que, caso Roberto Marinho sacasse o dinheiro na boca do caixa e fizesse uma aplicação financeira no próprio Banerj receberia US$ 3 milhões, em valores da época.

“Nenhuma outra quadrilha, inclusive movimentos terroristas, lucrou tanto no negócio de assalto a banco como a quadrilha da Rede Globo. Só no Banerj expropriou um bilhão e oitocentos milhões de cruzeiros. Em retribuição, Roberto Marinho levou toda a diretoria do Banerj para trabalhar na Globo: Miguel Coelho Neto Pires Gonçalves, Diretor Superintendente do Banerj virou Superintendente da Rede Globo; Antônio Carlos Yazeji, Paulo Cesar da Silva Cechetti e Pedro Saiter (ex-vice-presidente, ex-diretor, ex-gerente geral, todos do Banerj) foram agraciados com pomposas diretorias na Rede Globo.” [Fonte]

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Harry Strunz, aparentemente, é o herdeiro de uma empresa importadora situada no Panamá, especializada em importar produtos norte-americanos.

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O presidente da firma, Jose Manuel Aleixo, foi diretor financeiro da Globo.

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A ICAZA, GONZALEZ-RUIZ & ALEMAN é uma firma de advocacia que prestou consultoria para a firma.

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Pelo que entendi dos documentos, a empresa foi criada em 1984, logo após o fim da ditadura e dissolvida em 1995, quando o governo FHC assume o poder.

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Domingo Diaz Arosemena é, certamente, o herdeiro de um famoso político panamenho, de mesmo nome, conhecido por ter assumido a presidência da república em 1948 após uma eleição notoriamente fraudada.

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Rodolfo Ramon Chiari Correa é/era presidente da Hercules Entreprise, Inc, empresa sediada no Panamá, aparentemente também já dissolvida. Número da ficha da empresa no site de Registro Público do Panamá: 336763.

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Talvez não haja nada de ilegal na presença dos irmãos Marinho no quadro diretivo de uma empresa do Panamá. No entanto, como eles são proprietários da mais importante concessão pública de TV do país, creio que é de interesse jornalístico saber em que eles estão investindo no exterior. Ainda mais considerando que, alguns anos depois, os mesmos personagens protagonizaram uma tremenda fraude nas Ilhas Virges Britânicas, ao usarem um artifício ilegal para não pagar imposto de renda.

Além do mais, se a imprensa está tão interessada nos donos de um hotel desconhecido de Brasília, só porque Dirceu vai trabalhar lá, a ponto de viajar ao Panamá para descobrir quem é o presidente da empresa proprietária do hotel, bem poderia usar o mesmo esforço para levantar mais informações sobre os negócios no Panamá da família mais rica do país.

http://www.ocafezinho.com/2013/12/05/a-empresa-da-globo-no-panama/#sthash.tyvwjLzh.dpuf

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Cinco indicações

Por Marcus Vinicius


O Cabelo e a questão por trás do Romance

por Juan Pablo Villalobos
Janio Santos

Eu sempre tive um problema com meu cabelo. Não gosto do meu cabelo, acabei me resignando a ele, acabei por tolerá-lo, mas a verdade é que não gosto, não.

Em meu primeiro romance, Festa no covil, o protagonista é um menino que tem fobia a cabelo, que acha que o cabelo é um cadáver que as pessoas carregam por cima da cabeça. Em meu segundo romance, Se vivêssemos em um lugar normal, há um personagem que tem o cabelo como o meu: confuso. Ele se chama “agente Cabeleira”. Também escrevi vários contos com personagens de cabelos esquisitos e fiz uma entrevista ao Neymar só para escrever um artigo sobre seu cabelo, um texto que acabei titulando: “Que cabelo é esse, Neymar?”.

Faz dois anos que moro no Brasil e as pessoas começam a se acostumar a este fato. Ou seja, eles começam a me cobrar: você vai escrever um dia um romance situado no Brasil?
Há um mês fui cortar o cabelo com minha cabeleireira em Sousas, um distrito de Campinas, com ares de cidadezinha do interior. Quando cheguei, a cabeleireira me mostrou a mão esquerda dela desde longe: tinha fraturado um dedo. Entrei em pânico, tem poucas coisas que odeio mais na vida que procurar um novo cabeleireiro. Era uma quinta-feira e na sexta eu tinha o lançamento de Se vivêssemos em um lugar normal em São Paulo. Meu cabelo estava desastroso. Pensei: e agora? Eu não posso ir a meu lançamento com esse cabelo, de jeito nenhum! Minha cabeleireira queria me tranquilizar:

— Eu posso cortar seu cabelo, sim.

— Você está trabalhando assim?

— Tô, sim.

Olhei para ela, para os olhos dela, olhei para a mão e pensei: mas que classe de país é esse? Não tem um sistema de proteção social e laboral para minha cabeleireira ficar em casa fazendo fisioterapia? Além disso, como é que ia ficar meu cabelo? Quis fugir, não era razoável me arriscar, mas minha culpa de classe foi maior: não tive coração de abandonar minha cabeleireira e deixá-la sem meu dinheiro.

Dez minutos mais tarde, senti um ligeiro golpe na minha cabeça: era um pedaço de um dedo de minha cabeleireira.
— Me leva ao posto de saúde! — gritou minha cabeleireira.

Chegamos ao posto de saúde e me lembrei do romance de Rodrigo de Souza Leão, Todos os cachorros são azuis, que eu traduzi para o espanhol: “Havia tanta gente, que se eu dissesse que o Maracanã em dia de jogo do Flamengo estava ali não seria nenhum eufemismo”.

Mas não se esqueçam da verdadeira tragédia: eu estava ali, acompanhando minha cabeleireira, com a metade direita do cabelo cortado e a metade esquerda intacta.

Enquanto esperávamos, eu pensava em um romance brasileiro, em um possível romance brasileiro sobre uma cabeleireira que tem que trabalhar com um dedo fraturado e acaba cortando outro dedo fora. Logo no posto de saúde, como sempre acontece no Brasil, aconteceria algum absurdo ainda maior e o enredo iria se complicando a cada vez mais.
Mas por que sempre acabo pensando em romances políticos?

Eu estava verdadeiramente preocupado por minha cabeleireira, mas ficava de olho no relógio: cinco e meia eu vazo, pensei, preciso procurar outro cabeleireiro.

Imagina ir no meu lançamento em Sampa com esse cabelo. Vão pensar que sou um excêntrico. Que faço isso para chamar a atenção. Ou pior: que sou idiota.

Eu falei para vocês: tenho um problema com meu cabelo.

Meus romances sempre começam com uma questão mal resolvida, com um conflito, com um trauma. A origem é autobiográfica. Essa questão se insere em um contexto social e político e só então penso no enredo: na ficção.

Se eu tivesse que estabelecer uma fórmula diria que meus romances estão construídos com 10% de material autobiográfico, 10% de material histórico e 90% de ficção. Não soma 100%? Hmmmm....

Eu fico superempolgado só de pensar no que poderia fazer com esse pedaço de dedo de minha cabeleireira em um romance.
Mas por enquanto a abandonei na fila do posto de saúde.

Quem sabe um dia escreva um romance no qual meu penteado seja o resultado dos problemas estruturais e das injustiças do Brasil.


http://www.suplementopernambuco.com.br/index.php/component/content/article/2-bastidores/1006-o-cabelo-e-a-questao-por-tras-do-romance.html