Nesta segunda-feira amanhecemos sem presidente. Ontem tivemos um dia frenético, como bem sabem. Tomamos café da manhã com mil adesivos na camiseta, almoçamos segurando garfo, faca e bandeira. Votamos. Gritamos entre vermelhos e azuis, postamos nas redes sociais e tentamos, até o último minuto, convencer vizinhos e parentes distantes a votarem no nosso candidato. Tudo em vão. Quem imaginaria esse desfecho? Um país com mais de 200 milhões de habitantes subitamente sem presidente.
Não houve qualquer explicação. Os candidatos sumiram e deixaram para nós uma missão intitulada “futuro do País”, pregada na testa de cada brasileiro que, assustado, correu para lavar o rosto logo cedo, incrédulo e inseguro. Não desgruda, pois é feita com material eterno e dura mais do que batom 24 horas. Alguns souberam da notícia pela televisão ou ao ler este breve artigo. O que importa é que já não se sustentam os insultos proferidos e o ódio destilado para defender e acusar um ou outro. Os que se abstiveram e por um segundo pensaram na frase “eu não gosto de política” já não podem brincar de Pôncio Pilatos.
Agora, com um destino tão certeiro, cada ex-eleitor compreenderá que é parte de um tecido social e que suas ações individuais impactam de forma certeira na vida coletiva. Estranho escrever o óbvio. Os formadores de opinião de última hora perceberão que não era só coisa de Facebook ou clima de clássico-rei, mas que os milagres imaginados poderão ser colocados em prática. Ou não, pois haverão embates. A democracia é território de conflito.
Como já havia antecipado, escrevo de Barcelona, na Espanha. Com um fuso horário de 4 horas, fui dormir sem presidente. Em espanhol, a forma de saudar as pessoas logo cedo é com um “buenos días”. Não se deseja apenas um único e solitário bom dia, tão caducável. Através da expressão, o interlocutor nos presenteia com um desejo plural. É como ganhar um buquê de flores coloridas que não murcham.
Que venham dias com mais bicicletas e menos carros importados. Mais reforma agrária e menos latifúndio. Mais terras indígenas homologadas e nenhum trabalho escravo. Mais árvores e ninguém apavorado. Mais solidariedade e amor ao próximo nos bons dias que virão.
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