quinta-feira, 2 de julho de 2015
Começaria tudo outra vez
Por Marcos Sampaio
Logo na primeira cena do documentário Começaria tudo outra vez, Cauby Peixoto aparece com um semblante entre o cansaço e a mansidão. O compasso da respiração entrega que estar ali no palco não é mais um exercício simples para o cantor de mais de 80 anos. No entanto, ele não dispensa o paletó de lantejoulas brilhantes, a peruca encaracolada e a maquiagem discreta que já fazem parte do seu personagem.
Ecoando os versos de Caetano Veloso (“Minha voz, minha vida, meu segredo e minha revelação”), a cena que abre o filme de Nelson Hoineff resume o personagem que vai ser descrito nos próximos 90 minutos. Com depoimentos e imagens de arquivo, Começaria tudo outra vez, apresenta o retrato de um homem que só quer existir sob as luzes do palco, mantém sua agenda de shows e acaba de lançar um tributo ao ídolo Nat King Cole.
Hoineff perseguiu o cantor durante um bom tempo. Foram dois anos de aproximação e mais quatro de filmagem. Com isso, o diretor conseguiu extrair momentos saborosos do intérprete que imortalizou Conceição. Um dos mais chamativos é ouvir Cauby falando sobre experiências sexuais com outros garotos na infância. “Chegou um momento em que eu o coloquei muito a vontade. Nós estávamos falando sobre os ternos, deitados sobre a cama dele. Já tinha virado uma conversa de velhos amigos, com zero constrangimento”, lembra Hoineff, por telefone, revelando que conseguiu a fala driblando o olhar sempre atento da empresária e cuidadora Nancy Lara, que está sempre ao lado do cantor.
Apesar da sexualidade do homem que foi sex symbol nos anos 1950 ser motivo de discórdia desde então, Hoineff nega ser este o ponto alto de Começaria tudo outra vez. “Acho que o importante não é ser homossexual ou não. Nos anos 1950 já seria uma tolice, imagine hoje. Em represália, ele nunca falou disso. No entanto, o filme permitiu que, pela primeira vez, ele falasse nisso”, defende o diretor que optou por não contar uma história cronológica ou didática. Seguindo os passos do cantor por bastidores e em casa, o filme apresenta pistas sobre as causas e efeitos de uma carreira duradoura e ainda em plena atividade.
Depois de documentários retratando figuras como Paulo Francis (Caro, Francis), e Chacrinha (Alô, alô, Terezinha!), Hoineff sabe o que buscar nos seus personagens. “O que me interessa é a veia transgressora. Logo, não são documentários, mas filmes que se utilizam das pessoas para falar de transgressão”, define o diretor que encontrou nas dualidades de Cauby muito das suas transgressões. Entre o brega e o chique, o masculino e o feminino, o dono de uma das vozes mais admiradas do Brasil é também um homem calado e discreto, que, apesar de viver cercado pelo público, tem poucos amigos. “O que é grandioso nele é o olhar e eu vou buscá-lo ali. É isso que a gente tem que descobrir”, sugere.
SERVIÇO
Filme Cauby -Começaria tudo outra vezQuando: sexta,3, às 18h30 e domingo, 5, às 10h30
Onde: Cineteatro São Luiz
Ingressos: R$ 6 (inteira) e R$ 3 (meia)
http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2015/07/02/noticiasjornalvidaearte,3463392/bastidores-em-cena.shtml
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