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terça-feira, 17 de outubro de 2017

Histórias que Laís conta – 8

Laís Barreira

A vida como ela é!


Vovó Jovina, mãe do meu pai, foi uma mulher contraditória. Era pequenininha e aparentava mais jovem, porém era uma mulher durona, de princípios rígidos, muito autoritária com os filhos e netos.

Para se casar com o homem do qual ela gostou na juventude, precisou fugir de casa. Isso aconteceu provavelmente porque seus pais deviam ser muito rigorosos com a filha e não devem ter visto com bons olhos seu romance com aquele viajante, que era como se chamavam os vendedores de tecidos e artigos (futuramente chamados de caixeiros-viajantes).

Pois bem, depois da fuga, para não ficar desonrada, os pais de minha avó fizeram o seu casamento, como vigorava a moral daquela época.

O curioso foi que, anos depois, a minha avó Jovina replicou a educação recebida dos pais, à qual ela precisou se rebelar, com os seus próprios filhos; ela não queria que nenhum deles se casasse e fez o que pôde para impedi-los.

Com os filhos homens ela não conseguiu, mas “torceu o nariz” a todas as noras. Já com as cinco mulheres ela foi ainda mais dura e não lhes deu o direito de traçar seus próprios destinos. Apenas uma delas se casou, depois de fugir, como a própria mãe; porém, minha tia Júlia faleceu prematuramente, do parto do primeiro filho; a tia mais velha, apelidada “Senhorinha” também faleceu jovem, de tuberculose.

As outras três, a quem chamávamos “tias Ayres”, nunca se casaram, ficaram solteironas e até o fim de suas vidas viveram juntas, uma cuidando das outras.
                                               
                                                                
***

Pelo lado da minha mãe, um tio pouco afeito a autoritarismos, casou-se com um “mulherão”, teve com ela dois filhos, uma baita decepção e ainda ganhou a triste fama de “chifrudo”, apelido que nem hoje em dia os homens aguentam. Imagine só naqueles tempos!

Eu ainda era meninota, mas lembro-me bem.

Meu tio era bonitão, alto e tinha os olhos claros, mas lhe faltava um pouco mais de inteligência e sua voz gaguejante não era das mais agradáveis de ouvir.

O fato é que os dois casaram e tiveram filhos, porém, sua mulher conheceu um engenheiro, pessoa importante, que tempos depois recebeu a homenagem de ter uma estrada, que liga dois estados brasileiros, com o seu nome.

Quando o tal engenheiro esteve aqui, fez amizade com o casal e passou a frequentar a casa da Praia de Iracema, local onde as famílias passavam férias e temporadas. Minha avó, Emisabel, que passava um período na casa deles, “maldou” logo daquela amizade e comentava que o engenheiro sempre ia lá para conversar; lá pras tantas, contava ela, a esposa alegava sede e entrava em casa, logo em seguida o engenheiro arranjava uma desculpa para também entrar e, nisso, ambos se demoravam lá por dentro. Só o bobo do tio não percebia nada.

Um dia eu estava passando férias na Praia de Iracema, na casa da família Markan, amigos de minha mãe e à tarde fomos passear pela praia.

Ao passar em frente à casa do meu tio, uma das pessoas que estava conosco apontou: “olha lá: aquela é a casa onde mora o chifrudo”! Imagine minha situação, eu era sobrinha do dito cujo; encabulada, olhei para o outro lado e fiz de conta que não sabia de quem se tratava.

O fato é que os dois se separaram, ela foi embora com o engenheiro para o Rio de Janeiro deixando os dois filhos com o ex-marido que, durante um bom tempo, moraram com a minha mãe.


(História narrada por Laís Barreira, aos cem anos e transcrita por Vólia Barreira).

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