A vida como ela é! (2)
Laís Barreira |
A
vida nos traz coisas inusitadas; uma dessas foi o casamento de uma de minhas
filhas (na década de 70) com o filho de um militar de alta patente, de
orientação política totalmente oposta à nossa.
Na
sua juventude, esse militar, quando foi delegado de Ordem Política e Social em
Fortaleza, chegou a prender algumas vezes o meu marido Américo, também jovem,
por “insubordinação” e “práticas subversivas”.
No
início do namoro nós vivíamos sob a ditadura dos militares; o presidente naquela
época era o General Médici (Governo
Emílio Garrastazu Médici 1969-1974, um dos mais duros e repressivos dos
governos militares) e havia muita censura a rádios e jornais, perseguição
política, tortura e morte de presos políticos (o
período do governo Médici ficou conhecido como “anos de chumbo” e foi a época de
maior repressão e censura à jornais, revistas, livros, peças de teatro, músicas
e outras formas de expressão artística);
foi um tempo de insegurança e medo, o Américo havia sido preso no início do
golpe militar (1964) e ainda estava com os seus direitos políticos cassados e eu,
ainda ressabiada com tudo que havíamos passado, não me sentia confortável com
aquela aproximação e dizia à minha filha
quando o jovem chegava lá em casa: “a
partir de agora não se fala de política; cuidado, que até as paredes têm
ouvidos”.
Porém,
como sempre foi nossa característica, nunca proibimos o namoro.
Com
o passar do tempo, ele foi se aproximando de toda a família, ganhando nossa
confiança e amizade e se revelou um admirador do Américo, passando a ser seu
discípulo no municipalismo e fiel e sincero amigo até o fim da vida do meu
marido. Um dos episódios engraçados deu-se no dia do casamento dos dois.
Durante
a cerimônia de casamento na igreja, um amigo nosso, que estava sentado ao lado de convidados
da família do noivo, ouviu o seguinte comentário a respeito do sogro de minha
filha: “o Góes tem um azar danado com os
filhos, primeiro casou uma filha com um guerrilheiro palestino e agora o filho
se casa com a filha de um comunista!”.
Apesar
das diferenças ideológicas, as duas famílias acabaram se entrosando, mantiveram
um bom relacionamento e essa história acabou virando uma piada engraçada.
(História
narrada por Laís Barreira, aos 100 anos e transcrita por Vólia Barreira.)
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