Quem sou eu

Minha foto
Agrônomo, com interesses em música e política

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Histórias que Laís conta – 2


Emisabel
Laís Barreira


Seu nome era Maria Isabel, mas, a forma como bordava em seus lençóis e toalhas, M. Isabel, definiu o apelido com que passaria a ser chamada pelos netos e netas.

Emisabel, como sempre a chamamos, era uma mulher alegre e extrovertida demais para o final do século XIX, época em que viveu sua juventude; sua risada chamava a atenção e provavelmente escandalizava os mais puritanos, porém, foi justamente o seu temperamento que encantou o jovem tenor espanhol que veio ao Brasil com uma companhia de ópera que acabou falindo e se desmanchando.

Uma companhia de ópera que vem da Espanha e vai para o interior do Ceará, se vê logo que não andava bem das pernas. Suas últimas apresentações foram em Sobral, cidade em que minha avó nasceu e foi criada por “padrinhos” que tinham “alguma posse”.

A estreia da ópera alvoroçou Sobral. 

O espetáculo era O Guaraní, estrelado pelo tenor José Ubeda Perales que interpretava Peri. Ao final da apresentação, o jovem tenor que era bonito, apesar de não ser alto, recebeu rosas da plateia; a escolhida para entrega-las representando a sociedade sobralense foi a jovem Maria Isabel.

Sobre isso minha mãe contava um fato engraçado: o buquê entregue ao tenor era amarrado por um belo laço de fita que encantou o garoto que trabalhava na casa de minha avó. Sem falar com ninguém, no dia seguinte o rapaz foi ao hotel onde a companhia estava hospedada e solicitou a devolução da fita do buquê. O tenor, envergonhado, procurou a senhorinha que lhe entregara as flores pedindo-lhe desculpas, pois “não sabia que era costume em Sobral devolver a fita do buquê”.

Assim eles se conheceram e o tenor encantou-se tanto pela moça que decidiu ficar definitivamente no Brasil e a história dos dois terminou em casamento.

Depois de casados, com a companhia teatral falida, ambos resolveram ir morar em Camocim que era uma cidade em expansão por causa do porto e lá abriram uma pensão que se tornou uma das melhores da cidade.

José, um jovem culto e muito inteligente, nunca mais se apresentou como cantor, voltou uma única vez à Espanha e terminou sua curta vida em Camocim como guarda-livros, que hoje é a profissão de contador, da pensão que tinha com a mulher.

Emisabel, ao contrário, viveu quase cem anos e morou muitos anos em Fortaleza com Elisa, a mais velha dos seus cinco filhos, minha mãe.
Eu, meus irmãos e irmãs, convivemos muito com essa avó avançada, que fumava charuto, não tinha “papas na língua” e falava palavrão, o inverso da minha mãe, recatada e muito religiosa.


 (História narrada por Laís Barreira, aos 100 anos e transcrita por Vólia Barreira.)

Nenhum comentário: