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quarta-feira, 19 de junho de 2013

Sobre bandeiras e estratégias

Por Juliana Castanha

No espelho d’água da Esplanada dos Ministérios, um manifestante lavava a bandeira do Brasil, esfregando como se o tecido estivesse encardido. Foi ontem (segunda 17/06) a noite, durante os protestos em Brasília. A imagem seria uma autêntica representação da democracia, da expressão popular. Não fosse por um detalhe.

No momento em que todos os holofotes estão voltados para o Brasil, por conta da Copa das Confederações, seria normal levantar suspeitas sobre as motivações partidárias do movimento. Mas não se trata disso. Em várias capitais, militantes que circulavam nesta segunda-feira com bandeiras de partidos políticos foram vaiados pela maioria. Os manifestantes de fato se apresentam como um grupo sem siglas.

Não se trata, também, de discutir a ação truculenta da polícia de São Paulo. Um claro desrespeito ao direito de expressão e à liberdade de imprensa. A reação da PM só fez engrossar o coro das manifestações, inclusive fora da capital paulista e do país. A questão central é: até que ponto um movimento de tais proporções sem objetivos claros tem legitimidade?

No início, foi o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo que levou as pessoas às ruas. Manifestantes fizeram barricadas, interditaram a Avenida Paulista. A cena se repetiu em outras capitais como Salvador, onde o "Movimento do Passe Livre” existe há dez anos. Porém, cinco dias depois, ninguém mais sabe explicar as reais motivações dos protestos. Ao que parece, a coisa se perdeu, fugiu do controle.

Alguns mostram indignação sobre o aumento do custo de vida. Outros reclamam dos recursos investidos para a Copa. Em Belém, a população cobra melhorias para o transporte público. Em Minas Gerais, um dos líderes do movimento protestava contra “a proibição das manifestações” e defendia “a ampliação do metrô” (em reportagem exibida hoje no Bom Dia Brasil).

É no mínimo contraditório ver ônibus incendiados em manifestações em favor do transporte de qualidade para a população. Ver ambulâncias do SAMU depredadas por quem cobra assistência à saúde. Ver no Rio de Janeiro o Paço Imperial, prédio histórico do século XVIII, ser destruído por supostos defensores do bem público.
Juliana Castanha

Nas redes sociais, os comentários se multiplicam. A classe média se viu representada e propaga a ideia de que “o país acordou”. Como se, finalmente, despertasse de um coma profundo, de um longo período de letargia. Já associam a imagem da presidente Dilma ao ex-presidente Fernando Collor de Melo, sugerindo o impeachment como o desfecho comum aos dois.

Um deles dizia: “Lula, seu cínico, a classe média cansou de tomar no lombo”. Comentários que nada têm a ver com o aumento da passagem de ônibus, muito menos com os investimentos na Copa. São expressão de uma classe média raivosa que nunca admitiu um governo de esquerda. Muito menos um governo de esquerda capaz de enfrentar a crise econômica que há cinco anos abala Estados Unidos e Europa.Grécia, Portugal, Irlanda, Itália e Espanha ainda sofrem os efeitos do endividamento e das medidas de austeridade fiscal.

É natural que o aumento da inflação, no Brasil, seja motivo de preocupação. É legítimo a população cobrar reação do poder público em todas as esferas. Sem a voz das ruas, não existe democracia. Mas é preciso refletir sobre as reais motivações e consequências dos protestos dos últimos dias, no país.

Tomara que os manifestantes tenham discernimento sobre suas bandeiras e estratégias. Tomara muito que o recado para os governantes seja claro. E que, de alguma forma, o grito das ruas traga resultados para a população.

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