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segunda-feira, 30 de junho de 2014

Caixa de Ódio (2)



Caixa de Ódio
(Lupicinio Rodrigues)

Tem coisas que as vezes tão fácil julgamos
Que até nos achamos capaz de fazer
Até num coqueiro as vezes trepamos depois não achamos por onde descer
Um arranhãozinho uma simples batida
Tem feito ferida capaz de matar
Por isso que eu sempre vos disse querida
Que a gente na vida deve se cuidar

Você por exemplo jamais pensaria
Que uma fantasia em um carnaval
Um simples prazer de uma noite de orgia
Pudesse algum dia causar tanto mal
Matar um amor que já tem tantos anos
Criar um inferno dentro do seu lar
Fazer do meu peito uma caixa de ódio
Como um coração que não quer perdoar

Caixa de Ódio



Vídeo - TV Cultura.

DVD - CAIXA DE ÓDIO: O UNIVERSO DE LUPICÍNIO RODRIGUES - ARRIGO BARNABÉ

O que aconteceu com os roqueiros dos anos 80?

Por Pedro Zambarda de Araújo
Via Rodrigo de Medeiros

O carioca Carlos Leoni Rodrigues Siqueira Júnior, conhecido somente como Leoni, tem uma carreira dedicada ao pop rock. Fundou e foi baixista e compositor do Kid Abelha entre 1981 e 1986, período em que a banda tornou-se um fenômeno, colecionando discos de ouro. É autor de todos os principais hits (“Seu Espião”, “Como Eu Quero”, “Pintura Íntima”, “Fixação”, entre outras).

Saiu depois de um desentendimento. Fundou a banda Heróis da Resistência e, desde 1993, está em carreira solo. Tem parcerias com Cazuza (“Exagerado”), Herbert Vianna, Léo Jaime, Roberto Frejat, entre outros.

Aos 53 anos, Leoni é uma exceção, uma mosca branca, entre a imensa maioria de seus colegas de geração: uma “pessoa de esquerda”, como ele se define.

Roger, do Ultraje a Rigor, e Lobão são macartistas. Dinho Ouro Preto, do Capital Inicial, não fala coisa com coisa, especialmente em política. João Barone, baterista dos Paralamas do Sucesso, repete clichês sobre “corrupção” sem parar — sempre contra o PT, naturalmente. Tony Belloto, guitarrista do que restou dos Titãs, é autor de frases originais como “é uma merda pensar como o Brasil há 30 anos ou patina, ou piora”. A lista é longa.

“Na época da ditadura, tínhamos um inimigo comum. Quando acabou, percebemos o que cada um pensava”, diz Leoni. Ele conversou com o DCM sobre música, política, seus companheiros dos anos 80 e o que Renato Russo e Cazuza estariam pensando dessa salada.

Por que a sua geração está ficando reacionária?

Não acredito que todos os músicos da minha geração tenham se tornado conservadores… Todo mundo tem direito a ter opinião. O Roger sempre foi liberal e capitalista porque ele é um defensor do livre-mercado. Ele acredita numa sociedade nos moldes da dos Estados Unidos. Por isso, não está sendo desonesto com as pessoas hoje em dia. Ele era contra a ditadura, mas sempre foi capitalista. Até “Inútil”, o hino do Ultraje a Rigor nos anos 80, era uma música que tem a cara dele, meio que menosprezando o povo brasileiro. Esse sempre foi o discurso dele.

Por nossas diferenças, eu tive vários debates com ele por email. O único problema é que ele perde a cabeça com gente que não concorda com ele e se descontrola. Ele leva para o lado pessoal. Mas, se o debate permanece no alto nível com ele, é bom.

O Lobão é mais imprevisível. E te digo o motivo: o que ele gosta é da polêmica. Eu vejo ele fazendo mais polêmica do que música hoje, sinceramente. Tem também o problema das respostas das pessoas na internet, que é um local bom para debates felizmente. Nas redes sociais, se você não concorda com alguém em algo, você é idiota e deve morrer.

Na época da ditadura, tínhamos um inimigo comum. Quando acabou, percebemos o que cada um dos músicos pensava. O Roger e o Lobão eram diferentes da esquerda, por exemplo. Tem gente que se tornou mais liberal com o tempo. Algumas pessoas acreditam mais numa democracia capitalista, com serviços públicos aqui e ali, mas com a economia privatizada funcionando. É diferente do que eu penso, porque eu quero serviços do estado que ajudem os pobres.

O rock não é, supostamente, um estilo rebelde…?

O rock, sobretudo o americano e o inglês, sempre foi mais ligado aos movimentos libertários individuais do que os coletivos. A meta da música foi te levar a usar roupas, drogas e fazer sexo da forma que você quiser, no seu individualismo. O rock foi interessante pra caramba, revolucionou os costumes, mas ele continua desligado do meio social e dos problemas coletivos. Minha postura pessoal não é essa do rock.

Uma pergunta hipotética: como seria se o Cazuza ou o Renato Russo, que foram seus amigos, estivessem vivos hoje? Teriam virado reaças também?

O Cazuza, no final da vida, teve uma preocupação política com o Brasil e fez a música “Ideologia”. Mas ele foi mais revolucionário no comportamento, ao assumir sua homossexualidade. Não sei se estaria engajado politicamente.

O Renato Russo era mais antenado com política, mas ele era melhor escrevendo letras do que agindo. Suas letras eram metafóricas. O disco V do Legião, de 91, falava sobre os problemas do governo Collor, mas sem citar ninguém diretamente. Eram letras sobre quem perdeu dinheiro com os saques da poupança na época, além dos desempregados. Acredito que o Renato faria boas músicas sobre o que está acontecendo no Brasil ultimamente.

O que você pensa sobre os protestos?

É complicado. Agora eu tenho um desânimo por perceber que o movimento todo gerou uma oportunidade de apontar erros no país, mas não mostra soluções. Milhões de pessoas foram pra rua, mas se você perguntar para as pessoas o que devemos fazer pelo país, elas não sabem responder. Vejo a Primavera Árabe, que derrubou ditaduras e colocou outras no lugar. Não solucionou os problemas de lá, mas é bom saber que temos o poder de mobilização. É bom a gente saber que, se a gente se mexer, a coisa muda. Mas é educativo saber também que isso não basta. Temos que aprender a conversar.

O que é mais triste é que os políticos não se organizaram para executar uma reforma política. Era isso, no fundo, que as pessoas pediram na rua. O “pemedebismo” instalado no Congresso cria alianças de partidos por interesses e propaganda. O sistema está errado. Esse políticos não se organizaram nem para dar uma resposta frágil. A gente tem que ir fazer mais barulho.




Os protestos são da esquerda ou da direita? E as pessoas que se manifestam contra a Copa do Mundo agora?

Estar a favor das manifestações não é de esquerda ou de direita. Há até vertentes mais radicais se manifestando, como aquela extrema direita que quer acabar com o comunismo e o bolivarianismo para colocar quase uma ditadura militar no lugar. Outros dizem que a extrema esquerda quer acabar com o capitalismo confiscando propriedades com a tomada de poder. E eu já vi gente se manifestando na rua porque há corrupção no país. Eu não consigo categorizar essas pessoas politicamente e parece uma coisa de velho, com medo de ser roubado por todo mundo.

Agora, perto das eleições, vejo algumas simplificações. Se você acha a Fifa suspeita, muita gente acha que você odeia Copa do Mundo e o futebol. Se você gosta da Fifa, é um petralha que gosta do governo. As coisas andam mais confusas ultimamente.

Qual é o seu balanço sobre a política cultural do governo Dilma?

Na parte cultural dos governos do PT, o de Lula foi bem melhor que o de Dilma, com o Gilberto Gil e o Juca Ferreira no Ministério da Cultura. O Gil ampliou os investimentos no ministério. O ex-ministro abriu um diálogo como eu não tinha visto antes. Cultura não é só história, dos grandes autores, mas sim toda a criação que fazemos hoje. Veio o governo Dilma e a ministra Ana de Hollanda interrompeu os avanços do setor. Ela achava que a cultura cigital era uma “brincadeirinha” na internet, por exemplo.

A ministra Marta Suplicy assumiu agora e nós conseguimos a aprovação do projeto Cultura Viva, criando pontos de encontro em comunidades populares para produção criativa. Essa me parece uma mudança de postura. Mesmo assim, acho que o governo Lula foi mais ousado culturalmente até agora.

De resto, acredito que o problema real dos governantes são os conchavos e as alianças ruins para se beneficiarem, prejudicando a sociedade. Esse método foi criado pelo PMDB e pelos congressistas do chamado baixo clero, que querem receber agrados.

As maiores críticas ao PT não vem da direita, mas de ex-petistas decepcionados com o governo. Eu não sei se o PT conseguiria governar sem alianças, mas as reformas precisam acontecer. Fica o aprendizado: As coisas não funcionam do jeito que gostaríamos. Os únicos dois partidos que vejo falar em reforma política são o PT e o PSOL.

Como a Internet mudou a música brasileira?

Agora a gente nunca teve tanta diversidade e riqueza musical. Até aparecer a internet, as gravadoras, que eram poucas, detinham tanto o monopólio da produção quanto o da distribuição. Não tinha como entrar em estúdio e já lançar algo. Era caro pagar produção, capa, fabricação, vinis e a distribuição física para o país inteiro, com jabá para rádios e pra todo mundo que precisasse. Se você não tinha gravadora, você estava fora do negócio.

Isso era ruim, mas não tão ruim a partir dos anos 80. A partir da minha geração, os selos independentes americanos começaram a ser vendidos para conglomerados de mídia. A Warner se transformou na Time Warner. Ocorreram várias fusões e o único interesse da indústria musical se tornou o lucro. A qualidade caiu para vender mais, e as músicas comerciais ficaram mais padronizadas. Depois da moda do rock, veio axé, lambada, pagode, sertanejo e depois até voltou o pagode.

Na era da internet, a gente pode fazer a nossa própria música. A represa das gravadoras se rompeu. Tem gente fazendo de tudo no Brasil. Cada cidade tem uma cena musical interessante e própria. Antigamente a coisa era mais concentrada no eixo Rio – São Paulo. O Brasil é grande e as pessoas sequer conhecem o mínimo. O músico de hoje também não precisa agradar muita gente, mas chamar atenção é mais difícil. Não dá pra ouvir tanta gente talentosa junto, e muitos acabam passando desapercebidos. O negócio da música pode ir mal, mas a música em si vai muito bem.

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-que-aconteceu-com-os-roqueiros-dos-anos-80-leoni-o-unico-que-nao-virou-reaca-fala-ao-dcm/

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Clube dos Gatos no Falso Amor Sincero



Por Eduarda Talicy

O Clube dos Gatos, uma das mais tradicionais agremiações musicais da Cidade, será o homenageado deste mês do projeto Falso Amor Sincero. Depois de Carlos Alberto Vieira, o Carlão do Zé Bezerra, convidado do mês de maio, agora é a vez dos seresteiros Newton Padilha, Flávio Torres, Zivaldo e companhia receberem as honras desse Falso Amor Sincero. Os “Gatos” integrarão a roda de samba que acontece no Kukukaya Casa de Show, amanhã, a partir de 17 horas.

“É um clube tradicional e muito respeitado em torno do samba em diversas vertentes e é formado por pessoas que, individualmente, têm uma enorme contribuição para o Ceará”, afirma o jornalista Felipe Araújo, um dos integrantes do projeto.

Grandes nomes da música cearense como Fausto Nilo, Nonato Luiz, Mona Gadelha e Augusto Pontes já passaram pelas mesas do Clube dos Gatos ao longo dos 15 anos de atividade da confraria. Desta vez, eles deixam de ser cicerones e viram convidados na roda de samba do “Falso Amor...”, que irá celebrar o repertório que embala as serestas do grupo.

O coletivo Falso Amor Sincero nasceu da vontade de celebrar a obra de grandes compositores do samba e prestar homenagem aos músicos locais que ajudaram a construir e defender o gênero. “O nosso foco são sambas mais tradicionais, e a gente procura contemplar esses repertórios com um samba mais cadenciado, cantado coletivamente”, afirma Felipe. “Trata-se de um coletivo, um encontro de gente que gosta e que quer celebrar o samba”. (Eduarda Talicy/ESPECIAL PARA O POVO)

SERVIÇO
Falso Amor Sincero.
Quando: sábado, 28, 17 horas
Onde: Kukukaya (av. Ponte Vieira, 55, Dionísio Torres)
Quanto: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia)

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2014/06/27/noticiasjornalvidaearte,3273314/roda-de-samba-homenageia-clube-dos-gatos.shtml


quinta-feira, 26 de junho de 2014

QUANDO O INSTAGRAM NÃO EXISTIA

POR: ELIAS ANDREATO

Eu me demorava com mais cuidado e delicadeza no cotidiano da minha existência. Eu saía para a rua e olhava nos olhos das pessoas e tomava cuidado com as palavras para poder seduzir ou me deixar ser arrebatado por elas e por tudo. O diafragma das minhas retinas guardava os meus melhores momentos. Sempre que eu me apaixonava, queria que fosse eterno enquanto durasse...
Não tinha a ansiedade de dividir com mais ninguém além da pessoa amada. Eu saía do cinema ou do teatro só com a lembrança das imagens que despertassem minha curiosidade ou estimulassem meu querer saber, como se eu fosse um grande filósofo e pensador da alma humana.
Quantas vezes adormeci com a provocação de Fellini, Buñuel, Visconti, Godard, Shakespeare e Orson Welles; quando as lágrimas ou o riso inundavam o meu rosto.
Eu só tinha o espelho como possibilidade de registro para eternizar as minhas angústias ou dúvidas de querer ser um ser humano melhor.
Eu olhava para mim mesmo, cara a cara no espelho do banheiro, e dizia: “O que você vai querer ser quando crescer?”.
Eu não tinha amigos no Face. Eu queria amigos face to face para encostar a cabecinha no ombro e chorar.
Eu fumava, bebia, transava, estudava, trabalhava e ainda sonhava em transformar o mundo. Eu me indignava com a miséria, a fome, a ignorância, o preconceito e a corrupção.
Agora, tudo mudou. Não olho para mais nada. Sou o centro de tudo.
Eu me basto na solidão do meu iPhone 4, 5, 6... Me tornei um artista maior. Registro tudo, para poder provar que estive lá. Sem me importar se a minha poesia se tornou menor. O que conta não é mais a qualidade, e sim a quantidade de imagens e como sou visto, seguido e por quantos.
Estou bombando!

Invento o personagem que eu quiser. Sou o roteirista do meu próprio filme e ainda faço o meu fundo musical. Minha ilha de edição é fenomenal. Lanço o meu produto no mercado mostrando o meu melhor. É por isso que sou amado e invejado!
É verdade que, às vezes, não tenho mais opinião sobre o que está ocorrendo no planeta. Não entendo o que estão dizendo nos livros, nos jornais e nas revistas.
Só gosto das minhas fotografias. Perdão, dos meus selfies!
Os velhos que me perdoem, o que importa é estar na moda!
Ontem, tive um sonho antigo onde eu dizia baixinho:
“Ai que saudade de mim!”.

ELIAS ANDREATO É ATOR, DIRETOR.
http://www.revistadacultura.com.br/revistadacultura/detalhe/14-05-05/Quando_o_Instagram_n%C3%A3o_existia.aspx

Fado Tropical

Um dos maiores jornalistas desportivos do Brasil, apanha boleia da canção de Chico Buarque para declarar o seu amor por Portugal.


Gosto tanto de Portugal que pouco conheço de Portugal.

Sim, por contraditório que pareça, as cinco vezes em que já estive em Lisboa, as duas no Porto e a vez em que fui até Évora, foram poucas, muito poucas para quem quando pisa nele tem vontade de ficar, ficar e ficar.

Sou de uma geração de brasileiros vítima de duas bobagens de difícil recuperação: “Portugal de Salazar não merece uma visita” e “Portugal não é Europa”.

Ora pois, o país não se confunde com seu regime político e se a ditadura lusitana era ruim, e era, a brasileira também era — e nem por isso rejeitávamos o Brasil.

Já à bobagem seguinte só cabia uma resposta: “Ah, não é Europa? Azar da Europa!”.

Não falo da luz de Lisboa porque a cidade deveria se chamar Luzboa e nem do Bairro Alto, muito menos das frases sobre o Tejo, que virou o rio da minha aldeia, na pista de caminhada que o margeia, porque aí bate uma saudade insuportável.

Muito menos posso me referir ao pudim abade de Priscos que um dia comi no Porto porque aquilo já não é mais uma sobremesa, é pecado do qual ninguém quer ser perdoado.

Portugal para mim é Cascais, sem mais.

Évora, que devora e faz devorar.

É Sintra, que sinto, sinto muita vontade de ver todos os dias, por ela passar como se fosse comum, habitual, corriqueiro mesmo, sem sobressaltos, como se fosse possível lá estar e assim sentir.

É o Estoril, discreto, acolhedor, sutil.

Mas de tudo que gosto em Portugal, além dos restaurantes Bica do Sapato e Pap’Açorda, do meu amigo Fernando Fernandes, nada se compara ao povo português.

Está bem, pode dizer que estou a cair em demagogias, mas veja lá: minha avó materna, Mariazinha Esteves, era daquelas portuguesas pequeninas, perfumadas e detalhistas. Adoro ler o Público, gosto mais de Eça de Queirós do que de mim mesmo, sem esquecer de Alexandre Herculano, e entre o Benfica, o Sporting e o Porto fico mesmo com o Corinthians para não magoar ninguém.

Bebo na sabedoria de Manuel Sérgio, filósofo do esporte como poucos pelo mundo afora, na verdade como ninguém, doutor pela Universidade de Lisboa, de quem só não sou discípulo por me faltar competência para tal.

Como bebo os vinhos do Alentejo, do Douro, ou paro na tabacaria ao lado do tradicionalíssimo café A Brasileira para comprar um charuto com preço justo.

Gosto do sotaque e me divirto ao lembrar que Raul Solnado perguntava aos brasileiros: “Ah! e somos nós que temos sotaque?”.

Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal…

por Juca Kfouri

http://upmagazine-tap.com/pt_artigos/fado-tropical/

Meu querido Santo Antônio

Por DEMITRI TÚLIO

Haveria de ter um manual pra ensinar a ser filho. Principalmente quando os pais vão envelhecendo. Saber lidar com o que não é mais vigoroso e, agora, mergulha em lembranças e estranha o corpo que vai se desmilinguindo.

Dizer o que quando, mesmo medicada e acompanhada, insiste que está aos pés da morte? Que o médico não sabe de nada porque é novo demais? Que tem prioridade para ficar na cabeça da fila, por ter mais de 70, e não quer saber se, na sala de espera, existem mais dez iguais a ela? Que se recusa a tomar um remédio que ela diz não arrefecer o destroço que vem de dentro?

Aprender a ter paciência, saber ser presente como ela foi quando os seis sujavam as fraldas ainda de panos. Considerar o que ela reclama, mesmo que se faça de vítima nas besteiras mais bestas. Entender, quando me repete, que não se acostuma com uma casa tão sem nós.

Como é esquisito vê-la assim, parecida com minhas avós. Corpo mudado, braços e mãos com as marcas de tempo, roupa de senhora. E de uma tristeza que não cessa nem com remédios nem com as roseiras de “quem” tanto gosta.

Meu querido santo Antônio, pensei, agora, em você. Pode ser extemporâneo, mas me ensine a ser filho, me ajuda a aprender outro jeito de amor. Gosto dela desmedido, mas parece que é outra. Então, talvez, o problema esteja nos meus olhos de filho.

Também queria te pedir por uma amiga e um amigo. A mãe deles deslembrou, sofre da memória se apagando. Tenho impressão que se já foi. E é ruim admitir, mas não é mais a mãe dos dois. É um retrato envelhecendo! Que não fala, que não conhece pelo nome, que tanto faz como tanto fez.

Peço também por outra amiga, mãe de um amigo querido. Está penando porque ainda não aprendeu a ser viúva. Compreendo a aflição, foram mais de 40 anos com o primeiro e único homem. De repente, a casa sem ele, até o cachorro passou a reclamar. Era ele que o alimentava.

Está em pânico a mãe dele. O marido era quase tudo... A despensa, as contas da empregada, a gasolina do carro, o mato vai tomar o quintal! E de uma hora pra outra se assustou com filhos querendo saber da loja, do inventário, das receitas, das despesas...

Ver a mãe envelhecer carece de reaprender a ser filho. Passar horas ao telefone e calar: “Escute, me escute, sou sua mãe!”. Compreender seus dilemas, respeitar sua estrada, rir com ela. É estranho ouvi-la falar de despedidas, mesmo que seja para chantagear.

Mãe, nunca imaginamos, um dia vai escutar menos, os ossos vão ficar arriscados e a vista pouca. Vai virar menina, começar tudo de novo. E nós a levaremos ao cinema...

Meu querido santo Antônio, preciso de você. Me ensine a ser filho, me ajuda a aprender outro jeito de amor.

DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO,
demitri@opovo.com.br

quinta-feira, 5 de junho de 2014

A Natureza No Dia-a-Dia

Por Carlos Walter Porto Gonçalves,*

Sem que nos apercebamos, usamos em nosso dia-a-dia uma série de expressões que trazem em seu bojo a concepção de natureza que predomina em nossa sociedade. Chama-se de burro, ao aluno ou a pessoa que não entende o que se fala ou ensina; de cachorro ao mau-caráter; de cavalo ao indivíduo mal-educado; de vaca, piranha e veado aquele ou aquela que não fez a opção sexual que se considera correta, etc… Juntemos os termos: burro, cachorro, cavalo, vaca, piranha e veado são todos nomes de animais, de seres da natureza tomados – em todos os casos – em sentido negativo, em oposição a comportamentos considerados cultos, civilizados, e bons. O antropólogo Lévi-Strauss nos ensina que os romanos chamavam de bárbaros  aos outros povos tido por eles como não civilizados e que a palavra "bárbaro" originalmente significava canto desarticulado das aves. Portanto, bárbaro era o que é da natureza – ave – por oposição ao que é da cultura – romano. Chama-se de selvagem àquele que se encontra no polo oposto da cultura. E, notem bem, selvagem quer dizer da selva, mais uma vez, do plano da natureza.

A natureza se define, em nossa sociedade, por aquilo que opõe à cultura. A cultura é tomada como algo superior e que conseguiu controlar e dominar a natureza. Daí se tomar a revolução neolítica, a agriCULTURA, um marco da História, posto que com ela o homem passou da coleta daquilo que a natureza “naturalmente” dá para a coleta daquilo se planta, se cultiva. Com a agricultura nos tornamos sedentários e não mais nômades. Primitivos são aqueles que vivem da caça, da pesca e da coleta ou de uma agricultura itinerante, posto que não conseguem manter a fertilidade do solo, necessitando migar periodicamente em busca do alimento. Com a agricultura irrigada alguns povos se estabelecem sobre um determinado território de maneira mais permanente, mais estável. A vida se torna menos inconstante, domestica-se a natureza e, assim, forma-se os berços das civilizações na Mesopotâmia, no Egito, na China, etc. Dominar a natureza é dominar a inconstância, o imprevisível; é dominar o instinto, as pulsões, as paixões.

Tem-se como necessário o artifício das leis para evitar que retornemos ao reino animal, tido como lugar dos instintos. O Estado, a lei e a ordem são tomados como necessários para evitar o primado da natureza, onde reina o caos ou, no máximo, a “lei da selva”, onde todos lutam contra todos. Basta um rápido olhar sobre os diversos Estados constituídos com suas leis e suas ordens para notarmos o quadro de fome, de guerras, de opressões e violências de todos os tipos que eles mesmo instituíram em nome da civilização para constarmos a inconstância deste tipo de abordagem. Na verdade, encontramo-nos diante de um conceito de natureza que justifica a existência do Estado. Este é condição de “civilização” e “primitivos” são os povos que não têm Estado. Esta é uma das razões para que se chame de ingênuo ao ecologista que cita o indígena como modelo de relação entre o homem e a natureza.

Além disso, a expressão dominar a natureza só tem sentido a partir da premissa de que o homem é não-natureza…Mas se o homem é também da natureza, como falar em dominar a natureza? Teríamos que falar em dominar o homem também… E aqui a contradição fica evidente. Afinal, quem dominaria o homem? Outro homem? Isso só seria concebível se aceitássemos a ideia de um homem superior, de uma raça superior, pura – e a história já demostrou a farta as consequências destas concepções.

A natureza é,em nossa sociedade, um objeto a ser dominado por um sujeito, o homem, muito embora saibamos que nem todos os homens são proprietários da natureza. Assim, são alguns poucos homens que dela verdadeiramente se apropriam. A grande maioria dos outros homens não passa, ela também, de objeto que pode até ser descartado. A visão tradicional da natureza-objeto versus homem-sujeito parece ignorar que a palavra sujeito comporta mais de um significado: ser sujeito quase sempre é ser ativo, ser dono do seu destino. Mas o termo indica também que podemos ser ou estar sujeitos – submetidos – a determinadas circunstâncias e, nesta acepção, a palavra tem conotação negativo. Eis aí o paradoxo do humanismo moderno: sua imperiosa necessidade de afirmar uma visão de mundo antropocêntrica, onde o homem é o rei de tudo, o faz esquecer o outro significado do termo “sujeito” - o sujeito pode ser o que age ou o que se submete. A ação tem a sua contrapartida na submissão.

Já vimos como em torno do conceito de natureza se tecem no dia a dia as relações sociais. Talvez seja agora interessante localizar de onde brota essa visão de natureza entre nós.

*em "Os (des)caminhos do meio ambiente" - Editora Contexto pág 25 a 27

O Conceito de Natureza Não é Natural

Por Carlos Walter Porto Gonçalves,*

É comum entre aqueles que se envolvem com a problemática ecológica citar outras sociedades como modelos de relação entre os homens e a natureza. As comunidades indígenas e as sociedades orientais são, via de regra, evocadas como modelos de uma relação harmônica com a natureza. Se em diferentes religiões o paraíso é projetado no reino dos céus, para diversas ecológicas este se localiza em outras sociedades. Há uma virtude nesse procedimento: ele oferece um consolo, enquanto ideia, para o mundo em que vivemos – que concretamente não tem consolo. Isto não deixa de ser, à sua moda, uma critica à sociedade que não é tal e qual os modelos citados, daí as utopias. Nesse sentido, as utopias têm um lugar concreto no mundo onde não existem concretamente, sendo por isso sonhadas e projetadas enquanto utopias. Por outro lado, esse procedimento não deixa de ser também uma fuga dos problemas concretos, muitas vezes derivada de uma incompreensão das razões pelas quais em nossa sociedade e cultura as coisas são do jeito que são.

Toda sociedade, toda cultura cria, inventa, institui uma determinada ideia do que seja a natureza. Nesse sentido, o conceito de natureza não é natural, sendo na verdade criado e instituído pelos homens. Constitui um dos pilares através do qual os homens erguem as suas relações sociais, sua produção material e espiritual, enfim a sua cultura.

Dessa forma é fundamental que reflitamos e analisemos como foi e como é concebida a natureza na nossa sociedade, o que tem servido como um dos suportes para o modo como produzimos e vivemos, que tantos problemas nos tem causado e contra o qual constituímos o movimento ecológico.

*em "Os (des)caminhos do meio ambiente" - Editora Contexto pág 23 e 24


TUCO em Fortaleza

TUCO em agosto no Falso Amor Sincero 

Rolling Tombstones

Por José Diogo Quintela*

Portugal acaba de perder uma soberba oportunidade para reforçar o estatuto de coqueluche do turismo mundial: na quinta-feira, estiveram cá os Rolling Stones e nenhum dos seus elementos faleceu em solo português. É muito azar. Neste momento, receber um concerto dos Rolling Stones é como comprar um bilhete de lotaria. É uma espécie de jogo das cadeiras em que, quando a música pára, é porque o músico se finou. Depois é só ver em que país se deu o óbito. Não é bem uma tournée, é mais uma tômbola. Infelizmente, desta feita, a taluda não calhou a Portugal.

Qual a probabilidade de ter cá quatro septuagenários com o historial de Mick Jagger, Ronnie Wood, Keith Richards e Charlie Watts, sem que nenhum tenha um ataque de coração? Trata-se de idosos que, por junto, consumiram mais estupefacientes do que em separado. O fígado de qualquer um deles está habilitado a arrumar carros em troca de moedas. Quem já foi ao Rock in Rio sabe que a Bela Vista é ventosa. É preciso ter falta de sorte para nenhum destes velhinhos ter apanhado uma corrente de ar fatal.

É que, se um desses anciões morresse e ficasse cá sepultado, Lisboa ia passar a ter mais uma atracção turística extremamente rentável. Segundo um estudo de uma consultora, um defunto internacional tem um impacto de 87 milhões de euros anuais para Lisboa. (Segundo outro estudo, um defunto internacional tem um impacto de 6,8 milhões de euros para as consultoras que efectuam estudos sobre impactos económicos em Lisboa. Aliás, só por ter escrito isto, já ganhei 34 euros.)

No cemitério Père Lachaise, em Paris, estão enterrados artistas estrangeiros como Jim Morrison, Oscar Wilde e Maria Callas. As suas sepulturas são visitadas por milhares de turistas que desejam tirar fotografias junto a pedras tumulares de falecidos que, em vida, foram famosos. (Claro que também ajuda o facto de ser em Paris: numa cidade onde os residentes vivos são tão mal-educados, é natural que o turista acabe por se afeiçoar aos habitantes mortos.)

É preciso captar famosos para virem falecer ao nosso país e servir de chamarizes. Mostrar que em Portugal há boas condições para morrer com prestígio.

Se há romarias para visitar Morrison, também haveria para visitar um mausoléu dos Rolling Stones. Afinal, trata-se igualmente de músicos drogados. É curioso que os excursionistas tenham grande gosto em passear por sítios frequentados por toxicodependentes mortos, mas evitem sítios com toxicodependentes vivos.

De que é que o Turismo de Portugal está à espera para começar a apostar no segmento de turistas que apreciam conhecer lugares onde se estão a decompor os restos mortais de artistas de antanho? Portugal não pode basear a sua reputação apenas nas referências elogiosas de blogues escritos por pessoas estrangeiras que viajam sozinhas e que, em virtude da solidão e de despacharem uma garrafa de vinho branco ao almoço, acham tudo espectacular, da luz ao eléctrico 28.

Tem de entrar no circuito internacional do turismo glamórbido. Para já, é preciso captar famosos para virem falecer ao nosso país e servir de chamarizes. Mostrar que em Portugal há boas condições para morrer com prestígio. Aliciar os grandes nomes enquanto estão vivos. Atrair la crème de la cremation.

Depois, há que criar uma campanha com o slogan: “Vá para fora cá dentro do jazigo”. Ou, mostrando toda a variedade do país: “Praia. Campo. Campa”. E se quisermos mesmo impressionar os estrangeiros, então: “Portugal, Europe’s West Ghost”.

*Nasci em Lisboa em 1977 e, tirando o ano em que vivi no estado americano do Wisconsin, passei em Lisboa toda a minha vida. Sou casado, tenho uma filha e dois enteados. Comecei como guionista em 2001. Em 2003, com o Tiago Dores, o Miguel Góis e o Ricardo Araújo Pereira formei o grupo humorístico Gato Fedorento. Escrevo em jornais desde 2004, quando me estreei no Independente. Pontifico no PÚBLICO desde 2007.

http://www.publico.pt/portugal/noticia/rolling-tmbstones-1637754

A política dos selfies vista mais a fundo

Por Roberto Félix



O governador Cid Gomes anunciou ontem, através de sua conta pessoal no facebook, que a Empresa de Tecnologia da Informação do Ceará – ETICE implementará a Rede Wifi na Arena Castelão. A rede irá atender com qualidade 25 mil acessos simultâneos por meio de uma banda de 80 gigabytes por segundo, conectada por fibra óptica à antiga Gigafor, hoje conhecida como Cinturão Digital do Ceará.

A matriz de responsabilidades estabelecida pelo Comitê Organizador Local da Copa determinava que a implementação da Rede Wifi nas Arenas ficaria a cargo das Operadoras de Telefonia Oi, Claro, TIM e Vivo. Entretanto, faltando apenas 8 dias para o início do Mundial, o impasse persistia. Segundo às Operadoras, as empresas Administradoras das Arenas dificultavam ou até mesmo inviabilizavam o processo. A Secretaria Especial da Copa do Ceará desmentiu, informando que nunca houve contato por parte de qualquer Operadora para viabilizar a Rede Wifi no Castelão.

Ontem, o governador veio a público, informar que bateu o martelo e vai resolver este impasse. Como poderá ele fazer isto em um ínfimo espaço de tempo?

Solução

A ETICE licitou em 11 de março de 2013 equipamentos para construção de redes sem fio dentro do governo do Estado. A Ata de Registro de Preço 0001/2013 tem todos os equipamentos necessários para construir a Rede Wifi prometida para o Castelão. A Ata de Registro de Preço está disponível para consulta no site http://www.etice.ce.gov.br/index.php/redes-sem-fio-wlan . Já existe na Arena Castelão a conexão com o Cinturão Digital do Ceará (https://www.youtube.com/watch?v=pdRsRBQxoT0), portanto a infraestrutura básica para Rede Wifi já está encaminhada.

Quais os custos envolvidos?

O presidente da ETICE, Prof. Fernando Carvalho, informou que serão instalados 300 Pontos de Acesso (AP's) em toda Arena. Em 2013, foram licitados 4.751 unidades deste produto, ao custo unitário de R$ 2.531,89. O valor é superior ao de um ponto de acesso sem fio residencial, posto que é um equipamento que precisa ter alto poder de processamento para suportar grande fluxo de dados, assim como tratar congestionamentos e colisões na rede. Além disto, os equipamentos serão adquiridos com 5 anos de garantia na modalidade onsite e com nível de serviço de 24 horas, isto é, caso qualquer produto venha dar problema, a empresa contratada deverá consertá-lo ou substituí-lo por um novo, no local onde está instalado, em no máximo 24 horas a contar da abertura do reparo.

Outro equipamento necessário é o Controlador para Ponto de Acesso. Cada unidade é capaz de gerenciar até 100 AP's. Como a ETICE instalará 300 AP's, então serão necessários 03 Controladores, cujo custo unitário é de R$ 23.032,43 com a mesma garantia e nível de serviço dos AP's. Para finalizar, é necessário o Software de Gerenciamento Centralizado cujo custo é de R$ 31.135,08.

Numa soma simples, concluimos que o custo com os Pontos de Acesso será de R$ 759.567,00, Controladores será de R$ 69.097,29 e Software de Gerenciamento R$ 31.135,08. Totalizando assim, um investimento de R$ 859.799,37 num sistema que será legado para Arena Castelão após a Copa. Foi desconsiderado aqui o custo com cabeamento de rede para interligar os Pontos de Acesso aos Controladores, visto que a Arena Castelão foi dotada de rede de dados interna no projeto da reforma.

Tráfego de dados gerado

Outro custo a se considerar é o volume de dados trafegados. O governo já possui contrato com empresas que operam o backbone de dados governamental, interconectando o Cinturão Digital do Ceará à Internet. Ressalte-se que no momento que a rede de dados será utilizada pela Arena, o governo estará sob ponto facultativo, portanto não impactará na qualidade do acesso governamental à internet.

Considerações finais

Por fim, serão 25 mil acessos simultâneos à internet providos pela Rede Wifi do governo. Porém vale a reflexão: estamos indo ao Estádio para ver o jogo da Copa ou apenas para usar o Wifi? Além disso, as Redes de Dados das Operadoras Oi, Claro, TIM e Vivo, estarão reforçadas com a instalação de antenas extras nas proximidades do Castelão. Desta maneira, as Operadoras terão capacidade de suportar 43 mil acessos simultâneos. Se somarmos com os 25 mil providos pelo governo, teremos um total de 68 mil dispositivos conectados, quantidade superior a lotação máxima daquela Arena.

Quando a licitação dos equipamentos sem fio foi feita, ao final de 2012 para o início de 2013, não se poderia prever que as Operadoras não iriam implementar a Rede Wifi. Então não se pode alegar que o governo fez esta licitação pensando nesta hipótese, contudo se assim tiver feito, mais um ponto para o Governo que previu este cenário em seu planejamento.

segunda-feira, 2 de junho de 2014