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quinta-feira, 26 de junho de 2014

Fado Tropical

Um dos maiores jornalistas desportivos do Brasil, apanha boleia da canção de Chico Buarque para declarar o seu amor por Portugal.


Gosto tanto de Portugal que pouco conheço de Portugal.

Sim, por contraditório que pareça, as cinco vezes em que já estive em Lisboa, as duas no Porto e a vez em que fui até Évora, foram poucas, muito poucas para quem quando pisa nele tem vontade de ficar, ficar e ficar.

Sou de uma geração de brasileiros vítima de duas bobagens de difícil recuperação: “Portugal de Salazar não merece uma visita” e “Portugal não é Europa”.

Ora pois, o país não se confunde com seu regime político e se a ditadura lusitana era ruim, e era, a brasileira também era — e nem por isso rejeitávamos o Brasil.

Já à bobagem seguinte só cabia uma resposta: “Ah, não é Europa? Azar da Europa!”.

Não falo da luz de Lisboa porque a cidade deveria se chamar Luzboa e nem do Bairro Alto, muito menos das frases sobre o Tejo, que virou o rio da minha aldeia, na pista de caminhada que o margeia, porque aí bate uma saudade insuportável.

Muito menos posso me referir ao pudim abade de Priscos que um dia comi no Porto porque aquilo já não é mais uma sobremesa, é pecado do qual ninguém quer ser perdoado.

Portugal para mim é Cascais, sem mais.

Évora, que devora e faz devorar.

É Sintra, que sinto, sinto muita vontade de ver todos os dias, por ela passar como se fosse comum, habitual, corriqueiro mesmo, sem sobressaltos, como se fosse possível lá estar e assim sentir.

É o Estoril, discreto, acolhedor, sutil.

Mas de tudo que gosto em Portugal, além dos restaurantes Bica do Sapato e Pap’Açorda, do meu amigo Fernando Fernandes, nada se compara ao povo português.

Está bem, pode dizer que estou a cair em demagogias, mas veja lá: minha avó materna, Mariazinha Esteves, era daquelas portuguesas pequeninas, perfumadas e detalhistas. Adoro ler o Público, gosto mais de Eça de Queirós do que de mim mesmo, sem esquecer de Alexandre Herculano, e entre o Benfica, o Sporting e o Porto fico mesmo com o Corinthians para não magoar ninguém.

Bebo na sabedoria de Manuel Sérgio, filósofo do esporte como poucos pelo mundo afora, na verdade como ninguém, doutor pela Universidade de Lisboa, de quem só não sou discípulo por me faltar competência para tal.

Como bebo os vinhos do Alentejo, do Douro, ou paro na tabacaria ao lado do tradicionalíssimo café A Brasileira para comprar um charuto com preço justo.

Gosto do sotaque e me divirto ao lembrar que Raul Solnado perguntava aos brasileiros: “Ah! e somos nós que temos sotaque?”.

Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal…

por Juca Kfouri

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