Quem sou eu

Minha foto
Agrônomo, com interesses em música e política

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Mário Gomes

Por Henrique Araújo

Foto - Francisco Fontenele
Quando se punha em pé, o corpo de Mário Gomes envergava. 

Aos 67 de anos, a carcaça, como o poeta tinha se acostumado a se referir à própria carne, formava um arco, com a coluna dobrando-se quase numa meia-lua.

Era o modo de Mário equilibrar-se nas ruas de Fortaleza: maleável, deslizante, anguloso. Com o tempo, habitou-se a desviar de quinas e arestas, numa reengenharia social que impunha ao corpo uma lição tortuosa.

O poeta não foi pedinte. Foi pedestre.
Dispunha das pernas e dos versos.

Lírico à deriva pela cidade, fez da Praça do Ferreira e do Centro Dragão do Mar os entrepostos de uma romaria cotidiana em cujo altar repousava o gozo, única musa.

Celebrou a errância e aceitou a miséria. Dispensou conforto e lar, sem os quais a maioria de nós dificilmente admitiria viver. Andou ao passo do desatino.

Por conta própria, desorientou-se.

Na paranoia da metrópole, arremetia aos solavancos, amigo de muros, calçadas, árvores e bancos. Um Patativa em movimento, confundia-se com a paisagem.

Era cartão-postal ambulante, e nisso assustava sensibilidades, que viam nele apenas um trapo humano metido em farrapos. Poucos souberam conhecer o poeta Mário Gomes.

Nenhum comentário: