Artigo de Naara Vale, publicado no Vida e Arte de ontem, 2 de fevereiro de 2011 - Jornal O POVO.
Tinha tudo para ser mais uma mercearia de esquina. Um daqueles mercadinhos para onde a vizinhança corre quando falta o ingrediente de qualquer receita. Quando faltava combustível, também era para lá que os vizinhos iam porque até querosene encontrava ali. Isso lá pelos idos de 1956, quando Francisco Ferreira Neto, vulgo Chagas, mais conhecido como Seu Chaguinha, veio do Piauí trazer o sogro para um tratamento de saúde e por aqui decidiu construir sua vida.
Chaguinha e dona Arabenes - foto de Edmar Soares |
O rumo do negócio mudou quando os grandes supermercados apareceram. As prateleiras cheias de mantimentos começaram a ser preenchidas por combustível para as noitadas de seus frequentadores. A mercearia de esquina virara lugar de ir e se deixar ficar para uma conversa ao pé do balcão. O comerciante piauiense agora ganhava a vida como dono de bar. Tornara-se o proprietário do Bar do Chaguinha, que hoje chega aos seus 55 anos de vida, com o respeito de ser um dos mais tradicionais bares da cidade.
Luxo e chiqueza passam longe do bar incrustado bem no meio do Benfica. A arquitetura continua quase a mesma da mercearia de esquina aberta em 1956. Mas quem liga pra isso? A freguesia enche o local todos os finais de semana, nem que seja para comer uma panelada sentado numa mesa do outro lado da rua. “Se fosse um bar chique, num tinha a clientela que eu tenho, não. É só gente de classe. ‘Perrapado’ num vem aqui, não”, diz Seu Chaguinha, tido, para alguns, como o Seu Lunga do Benfica. “São 50 e tantos anos e os clientes velhos que não morreram ainda aparecem.”, garante o comerciante, na beirada de completar seus 79 anos.
A tradição e a clientela fiel do Bar do Chaguinha se fez em cima da simplicidade. Além do espaço – que inicialmente funcionava em frente a onde é hoje -, o cardápio não dá tantas opções assim para cliente, mas é suficiente para atrair gente de toda a Cidade. As oito delícias oferecidas ali são preparadas diretamente das mãos de Dona Arabenes Ferreira, companheira de Seu Chaguinha há 56 anos. “Eu tenho a melhor panelada da Cidade. A minha patroa é que faz em casa”, orgulha-se ele. Ela, no entanto, aposta na limpeza do bar como o principal atrativo. “Nossos banheiros são sempre limpos e cheirosos. O que importa é limpeza”, ressalta.
Se a comida atrai, a música é que faz voltar sempre. Pelo menos é o que seu Chaguinha imagina. “É a música que mexe com o coração do povo, minha filha. E a minha seresta é muito boa”, promete. Foi dessa paixão que o quase octogenário topou receber, em 2008, em frente ao seu bar, um dos blocos de Pré-Carnaval mais famosos de Fortaleza, o Luxo da Aldeia. Ele mesmo não se considera um carnavalesco, mas toda sexta-feira não deixa de ir para trás do balcão acompanhar o movimento dos foliões que tomam o seu bar. “O pessoal é que gosta, aí a gente tem que fazer”, esquiva-se.
O tempo já passou, mas os muitos anos ainda não foram suficientes para tirar desse senhor a “mania” de, diariamente, às 8 horas da manhã, ir para o bar esperar um velho cliente que queira uma companhia uma cerveja, ou apenas para um papo. “O que a gente tinha que fazer na vida já fez. Os filhos já estão criados... Agora é só complemento”, pontua. “Isso aqui é o que me mantém vivo. Se não tivesse o bar para fazer essa horinha, já tinha morrido. Gente velha, se parar, é caixão!”.
Onde
ENTENDA A NOTÍCIA
Aberto há 55 anos, o Bar do Chaguinha fica no coração do Benfica (Rua Padre Francisco Pinto, 144), mas seus frequentadores vêm de todos os cantos da Cidade para experimentar a famosa panelada do Chaguinha e a cerveja sempre geladíssima.
Naara Vale
naara@opovo.com.br
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