Quem sou eu

Minha foto
Agrônomo, com interesses em música e política

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Moral da História - Tatiana Belinky

Por Tatiana Belinky


Tatiana Belinky
Confesso que não gosto de livros que tragam no fim, ou mesmo no meio, uma sugestão - ou será imposição? - de como o(a) leitor(a)deve entender o que leu. A tal "moral da história", que é comum nas fábulas antigas. Sempre me lembro da travessa boneca Emília, do Sítio do Picapau Amarelo, que às vezes aceitava a moral da história (quando acontecia concordar com ela), mas na maior parte das vezes discordava e contestava essa moral. Como no caso da fábula cuja "moral" era "Fazer o bem sem olhar a quem". Emília se rebelou contra essa moral, declarando:"Fazer o bem, vendo a quem! Para o mau, pau!". Emília não é piegas; é, isto sim, adepta da justiça: "A cada um, segundo o que merece". É por aí


Mas o que eu ia dizendo é outra coisa. É que - como alguns(mas) de vocês até já sabem - o livro é um objeto muito mágico; a começar pelo fato de que ele é sempre maior por dentro do que por fora. Já pensaram que num objeto pequeno e portátil como esta cabem mundos e fundos, coisas muito grandes, não só dragões e dinossauros, mas castelos, arranha-céus, transatlânticos, cidades, batalhas, países inteiros...sem falar nas idéias, que estas não tem tamanho.


E mais: um livro é tantos livros quantos(as) os(as) seus(suas) leitores(as). Porque cada cabeça é um "filtro" diferente de outra cabeça. A cabeça de cada leitor(a) ilustra o livro à própria maneira, visualiza o que o texto lhe diz do seu próprio jeito, ninguém é igual a ninguém, felizmente, já pensaram nisto?


E mais ainda: cada livro é também tantos livros quantas vezes o(a) mesmo(a) leitor(a) relê o mesmo livro. E quanto maior o intervalo entre uma leitura e outra, tanto mais diferente fica aquele texto, aparentemente o mesmo. Isto porque o(a) leitor(a), no intervalo de alguns anos, e mesmo de alguns meses, já é, ele(a) próprio(a), outro(a), de certa forma. Porque cresceu, se desenvolveu, se enriqueceu. Ou - isto também acontece, infelizmente - regrediu, se empobreceu, seja por falta de uso da própria cabeça, seja por preguiça ou até por circunstâncias fora de seu controle...


O livro tem outra qualidade especial, que nenhum outro espetáculo pode oferecer. Digo "outro espetáculo" porque um livro não deixa de ser um espetáculo, que se projeta na "tela" ou no "palco" da imaginação de cada um(a), independentemente de ilustração. E a qualidade especial a que me refiro é a possibilidade e a liberdade que o espetáculo-livro oferece ao(a) leitor(a), de parar no meio, voltar atrás, ver o fim antes de ler tudo, reler trechos quantas vezes tiver vontade, pular trechos de que não gosta, deter-se para pensar, interromper-se para fazer outra coisa... Já o espetáculo de teatro, cinema, televisão, este tem de ser assistido de uma só vez, e muitas vezes não dá tempo de curtir, ou assimilar, esta ou aquela parte...E há também o fato de se poder carregar o livro para qualquer lugar, para o ônibus, para a cama, por exemplo,para onde não dá prá levar a peça de teatro...


Mas há, principalmente, a possibilidade de cada um(a) extrair do livro a sua própria "moral da história".


Do livro - Sustos e sobressaltos na TV sem VT e outro momentos - Editora Paulinas - 2006

Um comentário:

Rogério disse...

Que massa, isso:

"Cada livro é também tantos livros quantas vezes o mesmo leitor relê o mesmo livro