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terça-feira, 16 de abril de 2013

Cadinho, domésticas e um mundo sem mulheres

Por Daniel Fonsêca
Daniel Fonsêca


Desde março, o Fantástico exibe, em capítulos, a vivência de famílias sem a presença da “patroa” em casa. O quadro “Mundo sem Mulheres” mobiliza, em um só tempo, questões de gênero, de classe e de direitos humanos, confundindo o público como se expusesse uma ode ao protagonismo feminino.

A telerrevista utiliza o formato de reality show, que tem pouca preocupação com a realidade e até promete subvertê-la, mas não passa da aparência.

O contexto é marcado da sanção da PEC das Trabalhadoras Domésticas, que fundamenta direitos da categoria na Constituição. Só o fato de garantias básicas como FGTS e limite de jornada serem inéditas já é motivo de vergonha histórica e escancara o repertório casa grande & senzala ainda remanescente no Brasil, do qual segmentos sociais não querem abrir mão.

No programa que inaugurou o quadro, emulou-se uma espécie de Serviço de Atendimento ao Consumidor do Trabalho Doméstico, em que, a título de explicar dificuldades originadas com a PEC, representantes da distinta classe média se portam como clientes a tirar dúvidas sobre as “mercadorias” alvos da contenda jurídica. Algo similar deve ter ocorrido no áureo maio de 1888.

Os “nossos heróis” ainda teriam o “desafio” –deles, não delas – de lidar com o cotidiano da família abdicando dos papeis das mulheres como mães, esposas e, evidentemente, como domésticas. O enredo do quadro, que se pretende síntese da vida privada nacional, insiste que a intenção é valorizar a multifuncionalidade feminina.

Complementando a ficção jornalística, o narrador é Cadinho, o viril e provedor personagem de Avenida Brasil ainda encarnado em Alexandre Borges. É a estocada final do assujeitamento das mulheres, que se confirma com o destino outorgado às homenageadas: o spa – porque, afinal, outro dever intrínseco à condição feminina é o redobrado cuidado com a estética.

A alegação da Globo de pôr as mulheres como sujeitos “indispensáveis” tem um caminho de mais fácil execução e com maior êxito: eliminar esquetes do Zorra Total que as estigmatizam; vetar publicidades que fetichizam cervejas como devassos objetos sexuais ou, ainda, tratar, de temas quase interditados, como o aborto, com o rigor e a seriedade que merecem.

Enquadrar mães-esposas como necessárias ao lar do macho ou mercantilizar trabalhadoras domésticas não são indicativos de respeito, mas sim de desvalorização de direitos e de violência simbólica.

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